Durante encontro no Noroeste do estado, profissionais discutem as potencialidades da atividade

Por Aline Proença

Artesa Maria Anna Baudici

Em cada peça produzida, eles deixam a assinatura da criatividade, seja pela tradição cultural ou pelo cuidado em diminuir o impacto ambiental, dando vida a objetos que estariam se acumulando por aí. Apesar da habilidade a olhos vistos, os artesãos fluminenses enfrentam desafios diversos, como comercialização e organização grupal. Há três anos, a Rede de Artesanato Rural, apoiada pelo Programa Rio Rural, surgiu para alavancar o segmento. Um dos trabalhos mais importantes para promover essa evolução são as capacitações.
Neste mês de agosto, Itaperuna, no Noroeste Fluminense, foi sede da primeira capacitação da Rede em 2016. Artesãos de 13 municípios participaram das atividades.
Diferente das outras edições do evento, a capacitação teve como foco o protagonismo social. “Antes, nós éramos os únicos engajados na produção de conteúdo. Agora, incentivamos o grupo para que eles tomem essa responsabilidade para si, tragam demandas, avaliem o que vem sendo feito na área e como podem crescer”, comenta Rosani Staneck, gerente estadual de projetos sociais da Emater-Rio.
Evolução
O assistente técnico de organização comunitária do Rio Rural, Adriano Lopes, conta que os municípios atendidos pelo Rio Rural através de subprojetos para aquisição de máquinas de costura e insumos para a produção de artesanato vêm recebendo ações locais para impulsionar o setor. A partir da capacitação, com o diagnóstico do mercado feito pelos próprios artesãos, deve ser elaborado um plano de negócios. “Esse momento é importante para que eles conheçam a realidade de todos, para notar se os problemas são os mesmos, se os resultados são positivos e como podem fortalecer o artesanato regional, até mesmo buscando parcerias na iniciativa privada”, comenta Lopes.
Em uma das dinâmicas, os artesãos listaram os avanços grupais obtidos ao longo dos últimos anos. Os que ganharam maior destaque foram a troca de experiências, acesso à informação, gestão para o empreendedorismo e organização como processo competitivo.

“A troca de experiências é crucial para o empoderamento das artesãs e, consequentemente, para o fortalecimento dessa cadeia produtiva. Nosso papel é orientar para que encontrem soluções, estimulando a autogestão no artesanato, que é importante para o desenvolvimento rural sustentável”, destacou o secretário estadual de Agricultura, Christino Áureo.
Dificuldade transformada em oportunidade
De forma geral, um dos maiores desafios enfrentados por aqueles que se dedicam ao artesanato é a comercialização. Por isso, Maria Anna Bauduci resolveu adotar uma estratégia diferente para vender suas peças. Seguindo a tradição das “nonnas” italianas que se estabeleceram no século XIX em Varre-Sai, no Noroeste Fluminense, ela fabrica peças diversas usando retalhos de tecido, técnica popularmente conhecida como “patchwork”.
A colcha de cama de casal, feita com tecido e algodão, custa R$ 1 mil. Ao perceber que nem todo mundo estaria disposto a desembolsar o valor de uma vez só, Bauduci criou uma espécie de consórcio de artesanato. A artesã convidou moradores a ingressarem no sistema. Cada participante paga R$ 100 por mês durante dez meses. A cada 30 dias, uma colcha é sorteada entre eles. “Para mim é bom porque para produzir uma colcha desse tipo levo quase um mês. Para o público também é negócio, pois é como se fosse uma compra parcelada. Todos saem satisfeitos e eu mantenho minha atividade”, disse ela.
Troca de ideias
Essa e outras iniciativas bem-sucedidas foram divulgadas durante a capacitação. E o aprendizado das experiências coletivas também se deu de forma prática. Uma das atividades da oficina foi a “Troca de Saberes”, em que os artesãos ensinaram suas técnicas aos participantes. Após 20 anos envolvida com tricô e crochê tradicional, Rosimeri Procópio, de Laje do Muriaé, também no Noroeste Fluminense, aprendeu conceitos básicos da técnica de “crochê de grampo”, em que um pequeno tear é utilizado. “Eu só ouvia falar, nunca tinha visto de perto. Com o que me ensinaram aqui, já consigo aperfeiçoar”, comenta ela.

Rosineia Marques

Rosineia Marques

Design e sustentabilidade
Ao longo de sua existência, a Rede de Artesanato Rural vem trazendo inovação ao trabalho dos artesãos da zona rural fluminense. E um dos conceitos que começam a ser difundidos com maior intensidade a partir de agora é o design. Durante a capacitação, foram ensinadas noções sobre a importância da composição visual na produção de peças.
“Os artesãos fazem suas criações de forma livre, misturam cores, materiais naturais e sintéticos na mesma peça, baseados em seu gosto pessoal. O design surge para aperfeiçoar o trabalho, ajudando na harmonização dos elementos”, detalha Mônica Campos, arquiteta e uma das instrutoras da capacitação.
Ela explica que, além do senso estético, ao evitar a poluição visual e mistura exagerada de texturas, o design ainda ajuda na hora de decidir pelo preço final da peça. No Brasil, existe uma tabela padronizada a partir de itens variados, como técnica empregada e características do objeto – que pode ser meramente decorativo ou utilitário, a exemplo de acessórios pessoais e domésticos.
Outra preocupação dos envolvidos no trabalho da Rede é a utilização crescente de materiais sustentáveis, gerando um artesanato com apelo agroecológico. Rosinéia Marques, de São Francisco de Itabapoana, no Norte Fluminense, apostou nessa ideia. Dividida entre a paixão pelo artesanato e o trabalho como cabeleireira, ela decidiu se entregar de vez à arte com o trabalho manual há 16 anos.
Desde pequena, Rosinéia conta que gostava de fazer artesanato. Aos poucos, aprendeu técnicas de costura, pintura, além do uso de telhas para a produção de peças decorativas. Atualmente, o que ela mais gosta de fazer é reaproveitar peças que seriam descartadas e, a partir disso, criar algo utilitário. Uma de suas peças mais famosas é uma casinha que serve como ninho para passarinhos, fabricada com cabaça. O interior é retirado e a parte externa é pintada com linhas finas e delicadas. “Eu adoro fazer esse tipo de coisa. Nós ajudamos o meio ambiente, ganhamos renda e a nossa arte se espalha”, completa.