ec10Entidades protocolaram, nesta quinta (24), no Conselho de Defesa Econômica, representação contra práticas abusivas de empresas geradoras de energia durante crise de estiagem que afetou a produção energética no país.

Segundo federação, a inércia dos órgãos governamentais em não combater as falhas do modelo do setor pode levar a uma crise sem precedentes, que já apresenta reflexos negativos no setor industrial. Para o consumidor, o aumento na conta de luz será inevitável.

Diante da escassez de energia elétrica disponível, as empresas geradoras tiraram proveito da crise para lucrar com a venda de eletricidade no mercado de curto prazo. Para combater essas irregularidades, na quinta-feira (24), a Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) e a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) protocolaram, no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), representação contra as práticas abusivas das concessionárias geradoras de energia elétrica, que afetarão o equilíbrio econômico do país com perdas para a indústria e refletirão no aumento da conta de luz. 

Para a FNE, a preocupação do governo federal com a crise do setor elétrico, ao conceder subsídios e autorizar empréstimos com recursos públicos e privados às concessionárias de distribuição de energia elétrica, não apresenta solução para o problema já que a dívida será repassada aos consumidores ao longo dos próximos anos. No documento, as entidades denunciam que, para manter sua lucratividade, as empresas geradoras de energia deixam de firmar contratos, obrigando as distribuidoras a comprar energia no mercado de curto prazo. Ou seja, as geradoras não participam dos leilões oficiais promovidos pelo governo federal, destinados ao atendimento das distribuidoras, fazendo com que se tenha pouca energia disponível no mercado regulado, o que aumenta significativamente os custos de aquisição de energia. 

O diretor do Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (SEESP), Carlos Augusto Kirchner, explica ainda que as geradoras deixam de atender ao requisito legal de se contratar 100% da carga disponível. “A dívida acumulada em empréstimos emergenciais de socorro às empresas distribuidoras e aportes da União será bilionária e se tornará impagável, fazendo com que os prejuízos sejam repassados para as tarifas dos consumidores”, afirma.

As entidades pedem ao CADE que sejam adotadas medidas preventivas e coercitivas – com a abertura de inquérito administrativo para apuração das infrações à ordem econômica – junto a todos os agentes que estão se beneficiando com a venda no mercado de curto prazo. A consultora do Proteste, Flávia Lefevre, destaca: “São necessárias ações imediatas em vista da bilionária dívida que vem sendo acumulada e que vem sempre aumentando para socorrer as empresas distribuidoras e que serão pagas pelos consumidores de energia”. 

Segundo a FNE, essa política energética mercantil poderá desencadear uma crise econômica sem precedentes, além de afetar o setor industrial com a geração de desemprego, instabilidade, perda da competitividade e inflação. O presidente da FNE, Murilo Celso de Campos Pinheiro, argumenta que se trata de uma afronta não somente para os engenheiros, mas ao interesse público, aos consumidores de energia e ao setor produtivo do país. “Nós cobramos também uma posição da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) sobre a falta de fiscalização e intervenção nesse mercado que vem sendo explorado pelas geradoras, causando forte desequilíbrio entre agentes do mercado, com prejuízos para todo o setor produtivo nacional”, destaca. 

Carlos Kirchner acredita que a utilização de termelétricas, desde outubro de 2012, devido à forte estiagem no país, não é o único motivo do aumento de custo para a produção de energia. “Na verdade, a geração de energia pela fonte hidráulica não deveria implicar aumento de custos, pois a maioria delas é proveniente de usinas hidrelétricas já amortizadas, ou seja, com seus contratos de venda de energia encerrados no final de sua vigência em 31/12/2012 ou em 31/12/2013”, aponta. 

O diretor do SEESP explica que as empresas se respaldam em uma interpretação restrita e distorcida da legislação do setor elétrico para justificar suas condutas anticoncorrenciais e o aumento arbitrário dos lucros está em desacordo com regras de defesa do consumidor. “O fato de se produzir energia em uma usina hidrelétrica já amortizada como é o caso da Cemig, Copel e Cesp ao custo de R$ 20,00 por megawatt-hora e de vendê-la pelo preço de R$ 822,83, com margem de 4.000% (quatro mil por cento), viola o princípio do serviço público essencial, em que a regra é a do menor lucro possível”, comenta. 

De acordo com as entidades, a conduta das concessionárias é anticompetitiva e ilegal, pois o agente gerador transformou a sobra deliberada de energia numa prática corriqueira de lucro. Por sua vez, as distribuidoras de energia, que compram o produto caro no mercado, vão repassar o prejuízo integralmente aos seus consumidores, ainda que alguns empréstimos governamentais e privados protelem o pagamento destas dívidas.  “É inadmissível a conduta que tenha como resultado a retirada de energia do mercado, implicando em escassez artificial que leva ao aumento injustificado dos preços prejudicando a livre concorrência e também os consumidores”, conclui Flávia Lefevre.

Ambiente de Contratação Regulada
No ambiente de contratação regulada, a contratação de energia é feita por meio de contratos regulados. A ideia contida nesta segmentação é a de que a energia gerada por usinas existentes (energia “velha”) já amortizadas, poderia ser comercializada por preços menores do que aquela gerada pelas novas usinas.

Ambiente de Contratação Livre
É este ambiente que compreende a contratação de energia por contratos livremente negociados. De maneira geral, o atual Modelo do Setor Elétrico foi concebido com a pretensão de atender um marco regulatório estável de forma a atrair investimentos na expansão do sistema de geração, garantir níveis confiáveis de suprimento e proporcionar modicidade.

Mercado de curto prazo
Como a energia elétrica tem a característica de não ser armazenável em grandes quantidades e de forma economicamente viável após ter sido gerada, o balanço produção-consumo pode ter diferenças entre o volume contratado e o consumido. Essa diferença deve ser liquidada no mercado de curto prazo. O objetivo deste mercado é a contabilização e a liquidação de diferenças entre os montantes de energia contratados e os efetivamente consumidos ou produzidos pelos agentes. Esta atividade é realizada mensalmente, tendo como base o Preço de Liquidação de Diferenças (PLD) que é publicado antecipadamente pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). O valor máximo do PLD é definido com base no custo variável de operação da geração térmica mais cara disponível para participar do despacho centralizado. O valor mínimo do PLD, então, é estabelecido pela ANEEL, contemplando os custos da operação e a manutenção das usinas hidrelétricas e as compensações financeiras pelo uso dos recursos hídricos.

Mercado Livre de Energia
Pode se considerar como mercado imperfeito todo aquele em que um dos “players” ou o conjunto deles consegue manipular os preços a seu favor, maximizando assim seus lucros em detrimento da livre concorrência. Numa época de estiagem em que os valores do PLD atingem seu valor teto de R$ 822,83 por MWh, a forma das empresas geradoras de energia obter altíssimos lucros é muito simples e tentadora: simplesmente não ofertar a energia para ninguém e nem formalizar nenhum contrato de venda, de modo que toda a energia que fica sobrando é automaticamente classificada como uma diferença a seu favor e liquidada ao preço de PLD. 

Sobre a Federação Nacional dos Engenheiros

Fundada em 25 de fevereiro de 1964, a FNE (Federação Nacional dos Engenheiros) tem sede em Brasília e, hoje, é composta por 18 sindicatos estaduais, aos quais estão ligados cerca de 500 mil profissionais. A entidade foi constituída com o objetivo de representar nacionalmente a categoria, atuando na coordenação, na defesa e na representação dos profissionais, por intermédio de seus sindicatos. Atua intensamente na congregação de seus representados e luta pelos direitos dos profissionais, por melhores condições de vida e trabalho e pelo fortalecimento da democracia e suas instituições. Bandeira fundamental da entidade é também a luta pelo desenvolvimento do País com inclusão social. Tal objetivo está presente no projeto “Cresce Brasil + Engenharia + Desenvolvimento”, lançado em setembro de 2006, em São Paulo, durante o VI Conse (Congresso Nacional dos Engenheiros), e atualizado por ocasião do VII Conse, em 2009.