A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) representa os maiores frigoríficos exportadores do Brasil. Seu presidente, Roberto Gianetti da Fonseca, aponta em entrevista que seus associados não têm, de fato, como se certificar de que todo gado comprado na região amazônica não venha de áreas desmatadas ilegalmente.
Ele argumenta, no entanto, que na Amazônia muitas vezes sequer é possível saber quem é o proprietário de uma terra, quanto mais se ela tem alguma irregularidade ambiental. Em entrevista, ele garante que os frigoríficos estão, sim, comprometidos com a preservação da floresta.

Fantástico – Os frigoríficos que formam a Abiec compram gado criado em áreas desmatadas irregularmente na Amazônia?

Roberto Gianetti da Fonseca – As indústrias exportadoras de carne associadas a Abiec têm preocupação ambiental, tanto ou mais do que os ambientalistas têm aqui no Brasil. Não desejamos que o desmatamento ilegal seja ocupado pela atividade de criação de gado. De forma nenhuma isso é nosso interesse. O problema é que não há como rastrear [a origem do gado].

Estamos implantando hoje no Brasil a rastreabilidade sanitária e, paralelamente, estamos fazendo a rastreabilidade ambiental. Mas isso demora tempo. Isso já vem desde a década de 70 e 80, quando a criação de gado na Amazônia era estimulada com incentivo fiscal. Não é uma coisa recente que do dia para noite podemos consertar.

Há dois problemas. Primeiro, na Amazônia nem conhecemos direito a situação fundiária, quanto mais a situação ambiental para dizer se a área tem desmatamento ilegal ou não. Em segundo lugar, diferentemente da soja ou de outras culturas de solo, o gado anda. Então a dificuldade é saber, nas fases de cria e engorda, onde este gado esteve, se foi em zona de desmatamento ilegal ou não.

O Ministério Público Federal no Pará está entrando com uma ação em que cita os frigoríficos como co-responsáveis pelos desmatamentos ilegais. O senhor concorda?

Eu não concordo porque os frigoríficos não têm condição de checar ou de ter um documento legitimo e crível de onde esse gado procedeu. Não há nenhuma lei no Brasil proibindo o abate de gado por origem. E, neste caso, se fossemos pensar assim, o consumidor também estaria incorrendo no mesmo crime, que não existe. Não é previsto na lei esse crime para o frigorífico.

Há algum histórico de frigoríficos que recusaram comprar gado de criadores que sabiam que tinham desmatado além da conta ou cometido outro crime ambiental?
Com certeza. Muitos casos de frigoríficos, inclusive esses três que estão hoje instalados lá no estado do Pará, várias vezes já denunciaram ou falaram não, quando determinado fornecimento era de zona ou de região nitidamente ilegal.

O caso é que o pecuarista vai de qualquer forma abater o gado dele. Não estamos resolvendo o problema aí. Só estamos empurrando ele pro outro lado. Ele vai abater aonde? Nos frigoríficos clandestinos que, por sinal, ainda ocupam 30% do mercado brasileiro.

O que pode ser feito para que a pecuária não seja um fator de pressão sobre a Amazônia?

Para preservar a Amazônia da “invasão pecuária”, vamos assim chamar, que ocorreu, e que ainda é um problema corrente, há muitas soluções. Uma delas é aumentar a taxa de suporte das pastagens do centro-sul brasileiro, especialmente no cerrado, que ainda tem um suporte muito baixo – cerca de uma cabeça por hectare.

Poderia aumentar para duas cabeças por hectare. Hoje abatemos 40 milhões de cabeças por ano no Brasil. Podemos ir para 80 milhões se quisermos, sem derrubar uma árvore. É só melhorar a produtividade.

Mas abrindo frigoríficos na Amazônia a indústria não está estimulando os produtores a desmatar?

Abrir frigoríficos na Amazônia não é necessariamente a causa do desmatamento. Então a Amazônia não vai produzir carne? O pessoal lá tem direito de comer carne, de ter produção. O que não pode é fazer o desmatamento ilegal.

Globo Amazônia