Parlamentares de 20 países divulgaram um manifesto para defender a inclusão da água e do saneamento como direitos humanos nas constituições e demais legislações nacionais.

A reivindicação está no documento final da Conferência Parlamentar, realizada, durante o 8° Fórum Mundial da Água, em Brasília. No texto, constam ações parlamentares em prol de segurança hídrica, universalização do acesso à água potável, eliminação das desigualdades e desenvolvimento sustentável.

“O Poder Legislativo precisa apoiar a adoção de políticas públicas que assegurem a governança hídrica e o usufruto do direito humano à água potável e ao saneamento”, reforçou o coordenador da conferência, o senador Jorge Viana (PT-AC).

Entre os dez compromissos assumidos pelos parlamentares, também estão o apoio orçamentário e a segurança jurídica para essas iniciativas; a defesa do uso eficiente e equitativo da água nos setores agrícola, industrial e urbano; e a alocação de recursos em ações voltadas para populações mais vulneráveis. Os compromissos também citam compartilhamento de experiências e inclusão das organizações da sociedade civil nos debates sobre o tema.

Empenho
O presidente do Congresso Nacional, senador Eunício Oliveira, participou da abertura da conferência e assegurou o empenho do Parlamento brasileiro nessas questões. “Temos de elaborar um grande programa não apenas de leis, mas com imposições em prol da sobrevivência do planeta. Temos de revitalizar as nascentes, temos de ter recursos e não apenas a demagogia dos discursos”, declarou.

Também estiverem presentes parlamentares de sete países africanos, seis americanos, três asiáticos e dois europeus.

Organizador do fórum oficial, o presidente do Conselho Mundial da Água, Benedito Braga, elogiou a legislação brasileira de recursos hídricos e cobrou o comprometimento dos parlamentares de todo o mundo com a gestão da água. “Os técnicos têm boas soluções para o problema hídrico, porém, se não envolvermos os políticos e aqueles que tomam as decisões, não adiantará nada”, disse.

Agropecuária
Preocupado com o que chama de “preconceitos”, o coordenador de meio ambiente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), fez questão de participar dos debates.

“É a agricultura que preserva as margens de rios e as fontes. Não se pode vilanizar o agronegócio. Se o mundo se preocupasse com a água como o agricultor se preocupa, tenho certeza de que a preservação do planeta estaria garantida”, afirmou.

Fórum alternativo
Já o coordenador da comissão externa da Câmara sobre os fóruns mundiais da água e integrante da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Nilto Tatto (PT-SP), preferiu chamar a atenção para as discussões do fórum alternativo, promovido pelas organizações da sociedade civil, também em Brasília.

“O Fórum Alternativo Mundial da Água, este, sim, está preocupado com a água para consumo humano e dos animais. Nesta Casa, precisamos tomar cuidado porque, no Fórum Mundial da Água, está acontecendo uma série de negociatas para tratar esse recurso natural como mercadoria”, alertou.

O documento final do Fórum Alternativo Mundial da Água será divulgado nesta quarta-feira (21), após a plenária dos povos originários e tradicionais, na Universidade de Brasília (UnB).

Papel do Parlamento para garantir o direito à água é ressaltado em encontro

O livre acesso à água potável é um direito humano fundamental que precisa estar garantido em todas as constituições do planeta, diz o manifesto resultante da Conferência Parlamentar ocorrido no 8º Fórum Mundial da Água, em Brasília. Mais de cem parlamentares de vinte países assinaram o Manifesto Parlamentar ao final do encontro, ressaltando o papel fundamental dos Parlamentos para que o direito à água seja protegido nas legislações.

O documento também estabelece compromisso dos parlamentares com a segurança hídrica em todo o planeta, a universalização do acesso à água potável e ao saneamento básico, aperfeiçoamento da governança democrática da água e compartilhamento pacífico e justo desse bem entre as nações e dentro dos países.

Além disso, o documento firma compromisso dos parlamentares de dar prioridade orçamentária para ações de segurança hídrica e de uso racional da água e de buscar melhorar a eficiência hídrica dos processos produtivos. O manifesto fala ainda de compromisso com a eliminação das desigualdades e com a promoção do desenvolvimento sustentável.

O senador Jorge Viana (PT-AC) conduziu as reuniões. Antes da leitura do manifesto, ele afirmou que o grande legado do Fórum Mundial da Água no Brasil poderá ser sensibilizar e estimular um grande número de países a adotar medidas como a da PEC 4/2018. De autoria do próprio Viana, essa proposta de emenda inclui na Constituição  “o acesso à água potável entre os direitos e garantias fundamentais”.

Sede

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, ressaltou que o diálogo entre as instituições públicas, interna ou externamente, é fundamental para que se avance não só no direito à água e ao saneamento, como também no direito à justiça.

— Temos sede de justiça no Brasil. A justiça é como a água, sem elas morremos de sede. A justiça, como a água, atende a uma necessidade vital, a de viver em harmonia. Precisamos que a água e a justiça sejam para todos. Assegurar a água como direito humano fundamental é papel de todos nós — disse Raquel Dodge.

Ela anunciou que em breve será consolidado o Instituto Global do Ministério Público para o Meio Ambiente, que reunirá ministérios públicos de nove países: Chile, Moçambique, Belize, Honduras, Costa Rica, Panamá, França, México e Brasil. O objetivo do instituto é criar bases de proteção à água. Dodge também informou ter participado do Fórum Alternativo Mundial da Água, encontro paralelo realizado por movimentos sociais em contraponto ao fórum oficial.

Saneamento

Por sua vez, a ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva afirmou que o Brasil é uma potência ambiental e mostra isso ao sediar o Fórum da Água, uma grande responsabilidade. Ela lembrou que há atualmente muitos problemas migratórios pelo planeta que ocorrem devido à escassez de água e assinalou que mais de 100 milhões de brasileiros ainda vivem sem tratamento adequado de esgoto. Marina afirmou que a água tem seu valor econômico, mas também tem enorme valor social, valor cultural e valor simbólico.

— Estamos diante de uma crise sem precedentes. Trata-se de uma crise civilizatória. Uma crise que se combina de cinco crises: uma crise econômica, uma social, uma crise ambiental, uma crise política e outra de valores. Essa crise vai requerer de nós trabalhar as dimensões da sustentabilidade: econômica, social, cultural e ambiental, mas também política e ética. Precisamos juntar tradição e modernidade, economia e ecologia, ética e política. Esse é o desafio deste século, um modelo sustentável de ser e de fazer — disse Marina Silva.

O ministro interino da Secretaria de Direitos Humanos, Gustavo do Vale Rocha, disse que o Brasil é referência mundial em direitos humanos e direito ambiental, mas o acesso à água não consta da Constituição de 1988 como direito fundamental. Nem o saneamento básico.

— Não dá para avançar na questão da água se não avançarmos em saneamento básico — afirmou o ministro ao ressaltar que 60% dos brasileiros ainda não têm saneamento básico.

O presidente da Corte Suprema de Justiça da Argentina, Ricardo Lorenzetti, informou que está em gestação o Instituto Judicial Global Ambiental, que servirá para compartilhamento de experiências entre juízes e para ajudar os países a se prepararem para desafios ambientais do futuro.

A deputada francesa Sophie Auconie registrou que todos os dias, em todo o mundo, milhares de litros de água ainda são despejados sem tratamento na natureza. Ela disse que está sendo criada uma rede internacional de parlamentares pela água, objetivo que o Fórum Mundial e a Conferência Parlamentar estão ajudando a se concretizar.

A relação indissolúvel entre água e florestas foi destacada pelo diretor do fórum da ONU para florestas, Manoel Sobral. Ele recordou o filósofo da Grécia antiga Tales de Mileto, que dizia que o universo era feito de água e a água era “a medida de tudo”. Segundo ele, mais de 1,6 bilhão de seres humanos dependem diretamente das florestas para viver. Disse também que 50% das florestas do mundo estão localizadas no Brasil, Canadá, Rússia e Estados Unidos.

Também participaram do encontro os senadores Roberto Muniz (PP-BA), José Medeiros (Pode-MT), Ana Amélia (PP-RS), Regina Sousa (PT-PI), Lídice da Mata (PSB-BA), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Hélio José (Pros-DF), Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), Wellington Fagundes (PR-MT), Lasier Martins (PSD-RS) e Fátima Bezerra (PT-RN); o deputado português Pedro Soares; a presidente da Agência Nacional da Água (ANA), Christianne Dias Ferreira; o presidente da Associação Internacional para o Direito da Água, Stefano Burchi; o diretor-executivo do 8º Fórum Mundial da Água, Ricardo Andrade; o ministro do STJ Herman Benjamin e o especialista em direito ambiental internacional Arnold Kreilhuber.

Participaram o presidente do Senado, Eunício Oliveira, e o presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, senador Fernando Collor (PTC-AL). Também falaram o presidente do Conselho Mundial da Água, Benedito Braga, e a deputada argentina Julia Perié, entre outros.

Artur Hugen, com Agência Câmara e Senado/Fotos:Cléia Viana/AC/Leopoldo Silva/AS