Recortada por telhados de um cubismo espontâneo e atravessada por ruas sinuosas, Olinda tem sua vocação resumida nas palavras do poeta pernambucano Carlos Pena Filho (1929-1960): “Olinda é só para os olhos/ Não se apalpa, é só desejo./ Ninguém diz: é lá que eu moro./ Diz somente: é lá que eu vejo”. O casamento da cidade com as artes plásticas começou entre os anos 1950 e 1960.

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A migração artística foi estimulada pelo então prefeito Eufrásio Barbosa e o secretário de Cultura Vicente do Rêgo Monteiro, único pernambucano a participar da Semana de Arte Moderna de 1922. A eles, juntou-se Ypiranga Filho, no início dos anos 1960.

Pedro Carrilho/Folhapress
Mural na rua do Amparo, em Olinda
Mural na rua do Amparo, em Olinda

Os artistas fundaram o Movimento da Ribeira, que se desdobrou em ateliês, oficinas, espaços expositivos e tornou-se o centro nervoso da vida cultural pernambucana. Quando Barbosa foi afastado da política pelo golpe de 64, os artistas ficaram na cidade, tida como refúgio mais seguro que o Recife para o livre pensar e a produção de arte.

Uma delas pode ser vista na rua de São Bento, 154. Lá funcionou o Ateliê 154, que ganhou uma porta em madeira talhada pelo escultor José Barbosa. A maioria desses traços, porém, é subjetiva e pode ser vista no modo gregário como os moradores do sítio histórico se relacionam com a cidade e com as artes.

DE SORTE MESMO
O nome mais cultuado entre artistas é o do gravurista Gilvan Samico (leia à pág. F5), conhecido pela sua simpatia contraditoriamente reclusa. É preciso tempo e sorte para ser presenteado com seu bom humor.

O ponto oficial de venda de suas obras é o Sobrado Espaço Cultural. Não raro -e sem muita explicação-, algum comprador escolhe a peça diretamente em sua residência.

Se o sujeito for de sorte mesmo, como se diz em Pernambuco, encontrará por lá também Célida Samico, mulher do artista, que coloca tarô. Para quem mostra um tantinho de gosto por lendas e mitos, ela sorri para falar sobre o tema e explicar em quais histórias ancestrais foram baseadas as obras do marido.

No terceiro andar do sobrado fica o ateliê do artista, seus esboços, projetos futuros, matrizes e a prensa na qual imprime suas gravuras, com a ajuda do filho e também artista Marcelo Pelegrino.

Na rua do Amparo, ficam casa e ateliê de Tereza Costa Rêgo. Mais afeita a festas, é uma mulher com a vida marcada por tragédias -exilada política, perdeu o marido ao voltar para o Recife. Suas obras retratam cenas de bordéis e marcos da história sociopolítica nacional em tons de vermelho e amarelo.

Olinda também é a casa de João Câmara, que, apesar de não apresentar mais suas pinturas na Cidade Alta, ainda mantém dois casarões na ladeira de São Francisco.

Num passeio a pé, que vai do Amparo e passa pela Sé, estão os ateliês e residências de Maria Carmen, Guita Charifker e Luciano Pinheiro.

São olindenses históricos, que adotaram a cidade nos anos 60. Maria Carmen e Guita são vizinhas. A primeira retrata cenas cotidianas, a segunda privilegia em suas obras a botânica brasileira.

Luciano é um pintor e gravurista de muitas faces, cujas telas têm combinação forte de formas orgânicas e cores, como um Rothko tropical.