44 países firmam declaração a favor da descarbonização do transporte marítimo.

Brasil, que tem obstruído as negociações, fica cada vez mais isolado.

 

Dentro de duas semanas o maior acordo climático de 2018 poderá ser firmado pelo setor marítimo, que responde por entre 2% a 3% das emissões globais de gases de efeito estufa. A estratégia final não será adotada até 2023, mas a data de abril de 2018 foi definida para a adoção de uma Estratégia Inicial, que será finalizada na próxima semana, de 3 a 6 de abril, pelo Grupo de Trabalho Intersessional sobre Gases de Efeito Estufa da IMO. Como as questões são controversas, alguns elementos serão quase certamente transferidos para a reunião do Comitê de Proteção ao Meio Ambiente Marinho (MEPC), que será realizada de 9 a 13 de abril (“MEPC 72”), para deliberação final.

 

A Estratégia Inicial terá dois elementos importantes: uma visão ou ambição a longo prazo, provavelmente na forma de uma descarbonização de meados do século, redução de emissões ou meta de eficiência; e um objetivo de pico de curto prazo para as emissões e medidas para começar sua redução. Os países negociantes têm posições bastante distintas. As Ilhas Marshall e algumas outras nações querem uma meta de descarbonização ambiciosa até 2035. Já a União Europeia e algumas ilhas do Pacífico propuseram uma meta entre 70 e 100% de redução de emissões até 2050. Mas, um grupo de países liderados pelos BRICs mais a Argentina (Brasil, Argentina, África do Sul, Índia) se opôs a qualquer meta absoluta de redução de emissões. A China estava neste grupo de bloqueio, mas mudou para uma posição um pouco mais positiva.

 

A posição do Brasil – que tem em sua delegação cinco representantes da Vale, empresa de mineração que usa amplamente o transporte marítimo e que já foi acusada no passado de contribuir com a obstrução das negociações – contrasta com a de outros países da América Latina, como Chile, Peru, Colômbia e México, que junto com a França e outros 39 países assinaram esta semana a Declaração Tony DeBrum que pede a descarbonização do transporte marítimo.

 

Há 21 anos, desde o Protocolo de Quioto foi estabelecido, que a Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla em inglês) tenta debater o tema. Após o fracasso da discussão das Medidas Baseadas no Mercado para o transporte, em 2013, a discussão sobre as emissões marítimas ficou limitada a itens como Monitoração, Relatório e Verificação (MRV) de emissões individuais de navios até o Acordo de Paris ser adotado em 2015. Desde então, sob pressão de alguns países europeus e pequenas ilhas do Pacífico – que já estão sofrendo os perversos efeitos das alterações do clima -, em 2016, foi alcançado um acordo para desenvolver uma estratégia para os gases de efeito estufa do setor, que deve ter uma versão inicial acordada nas próximas semanas.

 

Se fosse um país, o transporte marítimo ocuparia o 6º lugar na lista dos maiores emissores. Se não fizer nada, suas emissões de CO2 devem crescer em até 250% até 2050, passando a representar então 17% do total mundial. Isso significaria que, mesmo que todos os países cumpram suas metas e que elas fossem compatíveis com o objetivo de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 C em relação aos níveis pré-industriais, ainda estaríamos violando esse caminho, com as consequências que todos conhecemos.

 

A regulamentação do setor marítimo pode abrir um precedente importante para o outro grande setor global deixado fora do Acordo de Paris, o transporte aéreo. Ambos ficaram fora tanto do Protocolo de Quioto como do Acordo de Paris, por conta de sua natureza específica: em um mundo globalizado, as empresas de transporte marítimo e aéreo muitas vezes são sediadas em um país, mas operam em outros – tanto para carga, como para descarga. Por isso, a tarefa de chegar a um acordo de redução de emissões foi passada para as respectivas organizações que representam essas atividades – a  IMO, no caso do transporte marítimo, e a IATA, no caso do transporte aéreo.