Entra em cena a militância 2.0, que está ampliando a democracia no mundo contemporâneo. Tenho falado sobre esse assunto para públicos diversos e noto que as pessoas ligadas à estrutura política institucional têm mais dificuldade para entender o que está acontecendo. Eis porque caracterizo este como um fenômeno “de borda”, pois o lugar que ocupa na cena pública é ao redor do centro.
Nestes dias, porém, a borda invadiu o centro. Primeiro, com a chegada ao Senado de mais de 1 milhão e meio de assinaturas reivindicando o impeachment do presidente recém-eleito da Casa. Segundo, com a visita ao Brasil e a audiência na Câmara da cubana Yoani Sánchez, cujo blog desde Cuba mostra ao mundo suas críticas ao regime político de seu país.
A reação dos que ocupam o centro da política convencional revela uma falta de entendimento que resulta em grave falta de coerência quanto à defesa dos direitos humanos e da liberdade de expressão. No caso das assinaturas contra o presidente do Senado, a falsa indiferença cheia de temor mostra que os dirigentes do Legislativo sabem que estão “mal na foto”, mas desprezam os esforços cidadãos de ampliar a democracia e de criar novas formas de a população influir na política e nas instituições.
O caso da blogueira cubana é mais grave: foi acionada uma campanha difamatória, com atos públicos de rejeição e –ato gravíssimo– impedimentos à sua liberdade de expressão, em que um grupo usou o ambiente democrático para reduzir a própria democracia. O irônico é que o Brasil, hoje chamado de “imperialista” nas ruas da Bolívia, do Peru e de demais vizinhos latino-americanos, parece esquivar-se do dever de qualificar sua democracia, duramente conquistada com a defesa firme da liberdade e dos direitos humanos, também em outros países.
Mas o que chama a atenção é a quebra da estagnação da política convencional feita pelos que espalham sua ação numa rede ampla, com recursos digitais ao alcance de qualquer um: um blog, uma coleta de assinaturas. Não foram pautados por governos, partidos, ONGs ou sindicatos. Começaram sozinhos, sendo autores e mobilizadores de sua proposta e ação.
É claro que o sucesso tem muitos pais; muita gente ligada a diversos organismos institucionais quer, hoje, “dar uma força” a essas e outras iniciativas. Isso, entretanto, só mostra que estão a reboque da nova força que emerge no mundo. Tudo bem, é melhor que tentem segui-la, em vez de impedi-la. Para usar uma saudação à moda antiga: vida longa ao ativismo autoral.
O grande desafio para essa nova forma de prospectar meios atualizados de realização da democracia é transitar do autoral para o coautoral, na defesa dos interesses coletivos, sem o que não há como realizar nenhuma transformação.