Em viagem à região, presidente Xi Jinping diz que nação “forte e rica” não deve intimidar a “pobre”
Pequim busca expandir influência sem passar imagem imperialista; veto de bilionário a TPP deve ajudar chineses
Johana Nublat (enviada especial a Santiago)
Enquanto o presidente eleito Donald Trump fala em fechar as fronteiras americanas, expulsar imigrantes e minimizar a presença do país em parcerias regionais, o líder chines, Xi Jinping, desembarcou na América Latina com o discurso de compartilhar avanços e receber países em seu “trem expresso do desenvolvimento”.
Xi iniciou na semana passada a terceira visita à América Latina desde sua posse em 2013. Na viagem, foi ao Equador e ao Peru – em Lima, participou da cúpula da Apec (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico) – e começou nesta terça (22) a viagem ao Chile, onde encerra a turnê.
“Todos os países são igualmente membros da comunidade internacional. O grande, forte e rico não deve intimidar o pequeno, fraco e pobre”, disse o chinês nesta segunda-feira (21), durante visita a Lima.
Já em Santiago, Xi se encontrou com a presidente Michelle Bachelet e disse que entendimentos colocam em evidência a disposição de enfrentar juntos desafios “perante novas circunstâncias”.
Durante a Cúpula dos Meios de Comunicação da China e América Latina, promovida pelos chineses em Santiago, em paralelo à visita oficial, Xi disse que seu país pretende organizar um intercâmbio, na China, para jornalistas latino-americanos e do Caribe, o que pode beneficiar até 500 profissionais.
A mensagem levada por Xi pode não deferir o discurso padrão de um líder de Estado em viagem, mas não deixa de se mostrar uma contraposição às promessas raivosas e isolacionista de Trump.
Na segunda (21), o republicano afirmou que, em seu primeiro dia de governo, vai tirar os Estados Unidos da Parceria Transpacífico, negociada por Barack Obama e vista como forma decisiva de influência americana no Pacífico, em contraposição aos chineses (que não estão incluídos e têm suas próprias ambições na região).
Para Greg Johnson, da Universidade de Valparaíso, a mensagem da China como alternativa aos EUA não virá de maneira explícita, apesar de os interesses chineses na região serem claros.
“Se o governo Trump se tornar o mais fechado do mundo, isso cria abertura para a China ter maior influência na região”, afirmou à Folha.
E a forma como a abordagem dos chineses é feita, segundo Johnson, pretende evitar a imagem de potência neo-colonial, como acabou ocorrendo na África.
“É o momento de construir pontes, não muros. De abrir mercados, e não fechá-los”. Disse Alicia Bárcena, secretária-executiva da Cepal (Comissão Econômica para América Latina e o Caribe), durante o encontro de imprensa.
Ela afirma ainda que, mesmo levando em conta os altos investimentos chineses e o fluxo comercial, é preciso pensar que há várias alternativas a uma eventual retirada americana. “Devemos concentrar esforços para conseguir uma maior integração interna.”
Na estada no Peru, Xi mencionou ainda mais “oportunidades” de verba chinesa para o mundo. Segundo a Xinhua, o presidente disse que a expectativa para os próximos cinco anos é investir US$ 750 bilhões no exterior.
VERBA ESTRATÉGICA
Evan Ellis, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos da US Army War College e especialista na relação entre os chineses e os latino-americanos, diz que, mesmo que os interesses da China fossem puramente econômicos, eles ainda devem ser vistos como estratégicos.
“O mais importante para os chineses agora é o crescimento continuado e a diversificação da economia, manter 1,35 bilhão de pessoas alimentadas”, diz. “Na China, quando o império perde a benção do céu, é quando a dinastia cai.”
Além disso, afirma Ellis, párea os chineses é relevante a manutenção da multipolaridade. “A sobrevivência e a prosperidade de países como o Equador, a Venezuela ou a Bolívia, que resistem ao modelo dos EUA, estão em seu interesse estratégico.”
Para Ellis, o Equador é um caso emblemático do investimento chinês na região, já que fez um uso produtivo do capital chinês. “Relativamente ao tamanho de sua economia, é o país em que empresas e o financiamento mais penetram”
Roberto Fendt, secretário-executivo do CEBC (Conselho Empresarial Brasil-China), diz que Trump criou para a China uma oportunidade “absolutamente incrível”, mesmo que não cumpra inteiramente as difíceis promessas da campanha.
E, independentemente do “efeito Trump”, diz ele, a expectativa é de crescimento da presença chinesa na região e, particularmente, no Brasil (que tem o benefício da escala frente aos vizinhos).
“Difícil saber a intensidade, mas parece claro que a presença chinesa não vai diminuir nem estancar”, afirma Fendt
A jornalista viajou a convite da agência chinesa de notícias Xinhua
publicado no dia 23 de novembro de 2016, no Jornal Folha de S. Paulo