A promoção do uso de dejetos como fonte de energia renovável e o planejamento antecipado da sustentabilidade e da qualidade de vida são as recomendações da sociedade para os Chefes de Estado
O desafio de aplicar conceitos sustentáveis a cidades com um ritmo cada vez mais acelerado de crescimento populacional pautou as discussões dos dez palestrantes do painel “Cidades sustentáveis e inovação”, nesta terça à noite. O tema marcou o encerramento do terceiro dia dos Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável, série de encontros com representantes da sociedade civil, comunidade acadêmica e científica e setor privado.

O arquiteto chileno Alejandro Aravena defendeu a necessidade de simplificar o processo de ações de medidas sustentáveis. Aravena defendeu que, mais do que tecer estrategemas complexos, é preciso usar modelos exitosos como ponto de partida. “A complexidade é paralisante”, argumentou o arquiteto. Entre esse modelos, está o de Masdar, uma pequena cidade em Abu-Dhabi, cujo modelo foi apresentado pela diretora de sustentabilidade Nawal Al-Hosany. Graças a um planejamento eficiente, a cidade conta com espaços comunitários e bom transporte público. Desde a implantação de inovações sustentáveis, como telhados de prédios que geram até um megawatt de energia, Masdar viu a demanda energética cair em mais de 50%. A temperatura também é dez graus abaixo do observado em cidades vizinhas.

O arquiteto japonês Shigeru Ban e o americano Barry Bergdoll, curador-chefe de arquitetura e design do MOMA, falaram sobre o conceito de sustentabilidade aplicado a regiões que sofreram recentemente catástrofes naturais, como as que atingiram o Japão há um ano. Convocado pelo governo do país para construir estruturas temporárias para os desabrigados, Ban falou sobre o dilema entre o uso dessas estruturas e de instalações permanentes. Sugeriu que houvesse cidades que se deslocassem pelo país. “Deveríamos fazer uma nova cidade, que fosse a capital do Japão, e muda-la a cada quatro anos. Talvez essa seja a chave para a sustentabilidade: parar de construir”, disse o arquiteto.

O canadense David Cadman, presidente do Conselho Internacional para Iniciativas Ambientais Locais, lembrou que desastres naturais serão mais prováveis caso não haja mudanças drásticas nas grandes cidades: “Dois terços da população vivem hoje em áreas costeiras. Se não reduzirmos o ritmo das mudanças climáticas, teremos grandes inundações em menos de 20 anos e, aí então, será muito difícil arranjar qualquer tipo de solução para as cidades”.

Ligada a todas as questões de sustentabilidade nas grandes cidades, a mobilidade urbana também foi discutida na mesa-redonda. O ex-governador do Paraná Jaime Lerner lembrou que 75% das emissões de carbono se originam na cidade e que metade delas vem do carro. “O carro é o cigarro da cidade”, comparou. “O que já se investiu em bancos e na indústria automobilística daria para salvar todas as cidades do mundo, com qualidade de vida. Não é difícil ser sustentável se você usa pouco o carro, separa o lixo e mora perto do trabalho”, afirmou Lerner.

As grandes distâncias entre favelas e regiões centrais e os desgastantes deslocamentos de trabalhadores também receberam críticas do mexicano Enrique Ortiz, ex-presidente da Coalizão Internacional de Habitação. “As cidades viraram um paraíso de especulação imobiliária. Os pobres estão sendo enviados para muito longe. Teve cidade no México que cresceu até 30 vezes. Não podemos pensar numa cidade sustentável com esses parâmetros”, afirmou Ortiz. A preocupação é compartilhada pelo senegalês Khalifa Sall, prefeito de Dakar, que destacou o intenso êxodo rural observado em algumas regiões africanas, e pela americana Janice Perlman, presidente do Projeto Megacidades, que há 40 anos trabalha com favelas ao redor do mundo.
Presidente emérito do Instituto Ethos, o brasileiro Oded Grejew lembrou que não bastam apontar problemas e ter ideias, é preciso estabelecer metas, prazos e sanções para governos que descumpram compromissos estabelecidos. “Sem uma cobrança forte, nada será feito”, afirmou Grejew. “Será muito frustrante se isso não der em nada”.

No fim do encontro, foram apresentadas as recomendações mais votadas pelo público online e pelos presentes da plenária. As escolhidas foram “A promoção do uso de dejetos como fonte de energia renovável em ambientes urbanos” e “O planejamento antecipado da sustentabilidade e da qualidade de vida nas cidades”. Insatisfeitos com a pouca abrangência da lista de sugestões disponíveis, os palestrantes se dispuseram a fazer a redação de uma nova recomendação, que consolide os temas discutidos nesse diálogo.

Sobre os Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável

Os Diálogos para o Desenvolvimento Sustentável iniciaram-se no sábado, 16 de junho, e se encerraram hoje na plenária do Pavilhão 5 do Riocentro. Foram dez rodadas de discussão, com dez participantes em cada uma, que abordaram temas prioritários da agenda internacional de sustentabilidade. A cada rodada, três propostas foram escolhidas, uma pelos palestrantes, uma pelos participantes da sessão e uma pelos internautas. As trinta sugestões mais votadas serão levadas aos Chefes de Estado e de Governo durante o Segmento de Alto Nível na Conferência.

Foram dez os temas dos Diálogos: (i) Desemprego, trabalho decente e migrações; (ii) Desenvolvimento Sustentável como resposta às crises econômicas e financeiras; (iii) Desenvolvimento Sustentável para o combate à pobreza; (iv) Economia do Desenvolvimento Sustentável, incluindo padrões sustentáveis de produção e consumo; (v) Florestas; (vi) Segurança alimentar e nutricional; (vii) Energia sustentável para todos; (viii) Água; (ix) Cidades sustentáveis e inovação; e (x) Oceanos. Todos os debates foram transmitidos ao vivo no website das Nações Unidas: http://www.uncsd2012.org.

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