Fábrica desativada de Hanford, de onde saiu a bomba de Nagasaki, guarda 200 milhões de litros de lama radioativa

Hanford: 177 contêineres de concreto cheios desta lama radioativa (Mark Ralston/AFP)

Hanford: 177 contêineres de concreto cheios desta lama radioativa (Mark Ralston/AFP)

Parecia uma boa ideia. Na corrida para construir uma bomba atômica durante a II Guerra Mundial, autoridades americanas isolaram um deserto intocado e construíram o primeiro reator de plutônio da história.

Hoje, 68 anos depois, a crise nuclear do Japão reaviva o temor da população nos arredores de Hanford, no estado de Washington, noroeste dos Estados Unidos. É lá que fica o maior depósito de lixo nuclear dos Estados Unidos. O local é a segunda instalação mais contaminada do mundo – atrás apenas de Chernobyl, na Ucrânia. São 200 milhões de litros de lama radioativa, subproduto da fabricação de bombas de plutônio.

Foi dos antigos reatores nucleares de Hanford, fechados há mais de 20 anos, que saiu a bomba lançada sobre Nagasaki em 1945. Hoje cerca de 12 mil pessoas trabalham no local simplesmente para garantir sua limpeza. O lixão tem 15 vezes o tamanho de Paris e abriga abaixo da terra 177 contêineres de concreto cheios desta lama radioativa. As autoridades dizem que é seguro.

Walt Tamosaitis, engenheiro com 40 anos de experiência, trabalhou na usina até o ano passado. Alega ter sido foi demitido por levantar questões técnicas sobre a segurança da usina. “É como dirigir um carro com os pneus carecas. Nos primeiros quilômetros o pneu aguenta, mas nada indica que vá continuar assim no futuro.”

Tamosaitis diz que a usina nuclear de Fukushima estava melhor preparada para uma eventualidade que Hanford. J.D. Dowell, do departamento de energia dos Estados Unidos, rebate a afirmação. “É como comparar maçãs e laranjas.” A usina japonesa tinha reatores ativos, enquanto Hanford está fechada há muito tempo para limpeza.

Tom Carpenter, do movimento ambientalista Hanford Challenge, teme o impacto de um terremoto ou atentado terrorista – além do lixão, a região também abriga uma usina nuclear em funcionamento. “Os governos não duram para sempre. Será que vai ter ainda alguém aqui em cem ou mil anos para garantir que ninguém vai entrar no local ou que os lençóis freáticos não serão contaminados?”

Indenização – Nos anos 60, a usina jogou seus dejetos diretamente na natureza. O poder público reconheceu que mais de 3,8 milhões de litros de lama tóxica haviam vazado e que parte havia penetrado o solo. As autoridades gastaram 100 bilhões de dólares para limpar o lixão. Pretendem também construir até 2019 uma nova fábrica para vitrificar a lama e estocá-la de maneira mais segura.

O Departamento americano de Energia garante que a segurança da instalação avança, com obras para proteger o Rio Columbia, que corta a região. Mas os ambientalistas temem que as verbas sofram com os cortes orçamentários debatidos no Congresso.

Tarde demais, de qualquer forma, para Gloria Wise, de 67 anos, moradora da região. Em 2005, ela recebeu uma indenização de mais de 300 mil dólares por causa de um câncer de tireoide, depois de processar a Dupont e a General Electric, que operavam na fábrica de bombas atômicas. A família de Gloria cultivava legumes no jardim. “Tenho certeza de que a radioatividade entrou em nossos alimentos”, diz. “Eu sei como essas coisas funcionam, as empresas não nos contam o que está acontecendo.”

(com AFP)

Fonte: VEJA