LUIZ FERNANDO EMEDIATO
É injusto acusar Eike Batista de bajular o governador do Rio por conta de incentivos fiscais para suas empresas; não são benefícios ilegais |
Percorri a Transamazônica duas vezes do início ao fim, em 1978 e em 1980. Numa dessas viagens, topei em Itaituba, no Xingu, com um jovem aventureiro. Chamava-se Eike Batista, tinha 22 anos e comprava ouro, concorrendo com o poderoso Zé Arara, José Cândido de Araújo, uma lenda dos garimpos.
Arara voava para os garimpos em aviões escangalhados, levando comida, ferramentas e prostitutas e trazendo ouro. Chegou a vender 30 toneladas para o governo, mas não se modernizou e desapareceu, enquanto Eike Batista foi empreender novos negócios e tornou-se dono da oitava fortuna do mundo.
Trata-se de pessoa excêntrica, esquisita, que coloca a letra “x” nos nomes de suas empresas, gosta de mulheres bonitas e desperta paixão, inveja e ódio.
Ao contrário do que se pensa, Eike não enriqueceu comprando jazidas identificadas por seu pai, Eliezer, ministro das Minas e Energia nos governos de Hermes Lima e João Goulart, secretário de Assuntos Estratégicos de Collor e várias vezes presidente da Vale.
Dos sete filhos de Eliezer, Eike é o único que enriqueceu. Ficou rico trabalhando. Talvez por isso se irrite quando o acusam de ganhar benefícios por ser amigo do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, a quem empresta aviões.
Nenhum governador deveria andar em aviões de empresários, mas, no caso de Eike, Cabral não pode dar a ele nada que já não tenha.
Mas pode, sim, viajar nos aviões de Eike, se puder explicar que nada está em troca, além de sua amizade.
É injusto acusar Eike de bajular o governador porque o Estado do Rio dá incentivos fiscais para suas empresas. Incentivo é uma coisa, benefício é outra. Incentivo é uma forma, como a palavra indica, de “incentivar” investimentos de risco.
Basta ver o que Eike está fazendo no Rio para perceber que ele está dando, e não tomando.
Os incentivos recebidos são daqueles que o governo concede para quem se arrisca. Não se trata de favor, está na lei. Para acusar Eike de ter levado benefício ilegal, seria preciso dizer qual, para qual empresa e quanto.
Sendo Eike um bilionário excêntrico e vaidoso -é direito dele ser do jeito que é-, e querendo fazer bonito no Rio, onde, por charme, é dono de restaurante e hotel, ninguém tem nada com o fato de que ele “deu” R$ 139 milhões para projetos sociais do Estado: criação de unidades pacificadoras em favelas, despoluição, equipamentos para hospital, ações sociais diversas.
O atrevido Eike afirma que é livre para selecionar suas amizades, faz o que quer com seu dinheiro e se orgulha disso. Eu faria a mesma coisa. Quando cruzei com ele comprando ouro em Itaituba, há 32 anos -aquele rapaz magrelo, com botas e chapéu-, confesso que pensei em seguir seu exemplo.
Infelizmente, continuei apenas jornalista e editor; como tal, não tenho dinheiro nem avião para emprestar, mas apenas princípios e histórias para contar.
Com meus princípios, convicções e palavras, eu faço o mesmo que Eike faz com o dinheiro dele. Ou seja: são meus, faço com eles o que bem quero, sem prestar contas a ninguém. E me orgulho disso.
LUIZ FERNANDO EMEDIATO, 59, escritor, autor de “Trevas no Paraíso”, é jornalista, ganhador do Prêmio Esso de Jornalismo e publisher da editora Geração Editorial.
Fonte: Folha de S. Paulo