Após reabilitação, dez peixes-bois serão reintroduzidos na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Piagaçu-Purus (RDS Piagaçu-Purus) para restabelecer a população que vive apenas na Amazônia
Vítimas de caça ilegal e criados boa parte do tempo em tanques de fibra sob proteção dos cientistas, dez peixes-bois ganharão uma nova vida a partir do próximo dia 1º de abril. O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC) fará uma expedição entre os dias 31 de março e 3 de abril para reintroduzir os animais no baixo Purus, um dos principais rios da Amazônia. Esta será a maior soltura desses animais no Brasil, desde que o Programa de Reintrodução de Peixes-Bois do Inpa foi criado, há dez anos, com apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
O peixe-boi (Trichechus inunguis) da Amazônia está ameaçado de extinção. Dóceis, grandes e de movimentos lentos, os animais são alvos fáceis para a caça e, para reduzir esse risco e restabelecer a população dessa espécie carismática, os dez mamíferos aquáticos serão soltos na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Piagaçu-Purus, próximo a Beruri (a 173 km de Manaus).
Até o momento, o Inpa já reintroduziu 12 peixes-bois aos rios da Amazônia. Desde 2016, eles são soltos na RDS Piagaçu-Purus, onde as comunidades da unidade de conservação do estado do Amazonas são parceiras do programa. “Nossa ideia é levar, de maneira inédita, dez animais de uma só vez. Normalmente, o Inpa tem reintroduzido de quatro a cinco peixes-bois por ano, mas o sucesso das solturas passadas com os animais se readaptando muito bem à natureza nos permitiu acelerar o processo”, explica o responsável pelo programa de reintrodução, o biólogo Diogo Souza. A última soltura aconteceu em abril de 2017, quando foram reintroduzidos cinco animais – três machos e duas fêmeas.
A expedição faz parte do Programa de Reintrodução de Peixes-bois da Amazônia, coordenado pela pesquisadora do Inpa, líder do Laboratório de Mamíferos Aquáticos (LMA), e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza, Vera da Silva, em parceria com o Projeto Museu na Floresta – uma cooperação científica entre o Inpa e a Universidade de Kyoto (Japão), e a Associação Amigos do Peixe-boi (Ampa).
Para que a adaptação dos peixes-bois seja bem-sucedida, antes da soltura definitiva, eles passam por um período de preparação de, pelo menos, um ano no semicativeiro, num lago privado de piscicultura, em Manacapuru. “Com a retirada desses dez animais, ficarão no local outros 14 e, em Manaus, estão outros 53 peixes-bois nos tanques do cativeiro do Bosque da Ciência, do Inpa”, explica Vera. “Nessa etapa de semicativeiro, o lago é um ambiente propício para o animal herbívoro se readaptar, gradualmente, às condições naturais, podendo se alimentar sozinho de pelo menos 13 espécies de plantas aquáticas, como mureru,capim-membeca e capim-navalha, além de ter contato com outros peixes-bois e demais animais aquáticos, como peixes e quelônios”, finaliza.
Selecionados
Uma vez por ano, os animais do semicativeiro passam por avaliação clínica para verificar o estado de saúde. Neste ano, os peixes-bois foram avaliados de 20 a 23 de fevereiro por uma equipe de 15 colaboradores do Inpa e da Ampa, formada por veterinário, biólogos, técnicos, tratadores e voluntários.
Durante o processo de avaliação, os resultados clínicos foram satisfatórios e, assim, foram selecionados os dez animais mais aptos para a soltura. São cinco machos e cinco fêmeas com idade entre 4 e 15 anos, cerca de 150 quilos e dois metros de comprimento. São eles: Aboré, Rudá, Gurupá, Manicoré e Itacoati (machos); e as fêmeas Anori, Adana, Baré, Piracauera e Naiá.
Diogo Souza explica que os animais estão em boas condições de saúde, com peso e tamanho adequados. “Desses dez animais, cinco receberão os cintos transmissores para monitoramento pós-soltura”, destaca o biólogo, ao acrescentar que os outros cinco serão soltos diretamente na natureza e não serão monitorados, em razão do sucesso dos outros indivíduos que já foram reintroduzidos.
A chegada da equipe e dos peixes-bois está prevista para o dia 1º de abril pela manhã, quando haverá uma atividade ambiental com as comunidades da reserva para conscientizar sobre a importância da preservação do peixe-boi. Na tarde do mesmo dia, a expedição segue para o local de soltura – um lago de várzea, na RDS Piagaçu-Purus.
Pós-soltura
Após a reintrodução, o biólogo Diogo Souza e uma pesquisadora do Japão continuarão na RDS durante dez dias para acompanhar os primeiros deslocamentos dos animais e entender como estão se comportando pós-soltura. O trabalho de monitoramento em tempo integral é feito por quatro assistentes de campo (comunitários da reserva – ex-caçadores de peixe-boi) que acompanham os animais diariamente com os equipamentos de telemetria fixados na cauda do peixe-boi. O equipamento emite sinais pelos quais o comunitário consegue encontrar o animal e saber os movimentos diários e sazonais, bem como a área de vida e o tipo de habitat que ele está ocupando na reserva.
Sobre a Rede de Especialistas
A Rede de Especialistas de Conservação da Natureza é uma reunião de profissionais, de referência nacional e internacional, que atuam em áreas relacionadas à proteção da biodiversidade e assuntos correlatos, com o objetivo de estimular a divulgação de posicionamentos em defesa da conservação da natureza brasileira. A Rede foi constituída em 2014, por iniciativa da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
Sobre a Fundação Grupo Boticário
A Fundação Grupo Boticário é fruto da inspiração de Miguel Krigsner, fundador de O Boticário e atual presidente do Conselho de Administração do Grupo Boticário. A instituição foi criada em 1990, dois anos antes da Rio-92 ou Cúpula da Terra, evento que foi um marco para a conservação ambiental mundial. A Fundação Grupo Boticário apoia ações de conservação da natureza em todo o Brasil, totalizando mais de 1.500 iniciativas apoiadas financeiramente. Protege 11 mil hectares de Mata Atlântica e Cerrado, por meio da criação e manutenção de duas reservas naturais. Atua para que a conservação da biodiversidade seja priorizada nos negócios e nas políticas públicas, além de contribuir para que a natureza sirva de inspiração ou seja parte da solução para diversos problemas da sociedade. Também promove ações de mobilização, sensibilização e comunicação inovadoras, que aproximam a natureza do cotidiano das pessoas.