Por: Giovanny Vera/OPAN
Publicação que reúne 25 artigos inéditos sobre empreendimentos no Tapajós é lançada em Brasília e já nasce como referência.
Esta semana foi lançado em Brasília o livro “Ocekadi: Hidrelétricas, Conflitos Socioambientais e Resistência na bacia do Tapajós”. A publicação, organizada pelo Programa de Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) e pela International Rivers com a parceria do Fundo Socioambiental CASA, da Operação Amazônia Nativa (OPAN), do Instituto Socioambiental (ISA), do Instituto Centro de Vida (ICV) e da Fundação Mott, traz artigos que abordam questões relacionadas a empreendimentos hidrelétricos, conflitos socioambientais e incompatibilidades entre políticas públicas e movimentos sociais de resistência em defesa de seus territórios e modos de vida nesta região.
Os lançamentos ocorreram em dois eventos. No Memorial Darcy Ribeiro da Universidade de Brasília (UnB), dia 12 e, dia 14, em audiência pública na Câmara de Deputados, contando com a participação de lideranças de povos indígenas e movimentos sociais, representantes do Ministério Público e coautores do livro. “Sabem o que ganhamos com a usina de Teles Pires? Nada”, reclama Darlisson Apiaká. “É uma desumanidade do governo violar nossos direitos com mentira. Querem nos tirar de onde a gente vive, querem acabar com a Amazônia, porque não é possível que com 153 barragens previstas na Amazônia ela possa existir”, fala Francisco Firmino da Silva, representante da comunidade de Montanha e Mangabal.
Em 25 artigos de pesquisadores vinculados a diversas instituições do poder público e organizações da sociedade civil, são ofertadas informações que promovem o aprofundamento do debate público sobre a implementação de hidrelétricas na bacia do rio Tapajós, uma região que pertence aos biomas amazônico e Cerrado nos estados de Pará, Amazonas e Mato Grosso, com valores sociais e de biodiversidade únicos. A publicação apresenta de forma abrangente e detalhada aspectos fundamentais do planejamento, licenciamento ambiental e implantação não apenas de hidrelétricas, mas de projetos de infraestrutura sinérgicos na bacia do Tapajós, traçando comparações e possibilitando a análise deste modelo de exploração proposto para a Amazônia.
Os autores do livro trazem dados contundentes que, nas palavras do procurador da República João Akira, que escreveu o prefácio, representam situações de basicamente duas ordens: déficit de participação democrática nos processos de decisão quanto ao planejamento e instalação de empreendimentos e precariedade nas opções de energia apresentadas. “Os processos de licenciamento acabam sendo sancionadores de violações de direitos”, comentou o procurador, que acredita na força e na importância da mobilização da sociedade para reverter este quadro.
Segundo Andreia Fanzeres, coordenadora do Programa de Direitos Indígenas da OPAN, a publicação, que vem acompanhada de um mapa com todos os empreendimentos hidrelétricos inventariados no Tapajós e suas sub-bacias, contempla dados econômicos, sociais, ecológicos, mostra as inconsistências técnicas dos estudos e dos processos de licenciamento na região, além de valorizar o olhar das populações locais. “As comunidades devem se qualificar cada vez mais para monitorar os impactos dos empreendimentos e incidir sobre os processos que estão em curso, desde as primeiras fases de pesquisa, para que tenham a chance de estabelecer uma participação honesta e justa diante de empreendimentos que podem afetar seu bem-viver”, acrescenta.
Contribuição da OPAN
A OPAN produziu o artigo intitulado “Barragens e violações dos direitos indígenas na bacia do rio Juruena”, escrito por Andreia Fanzeres e Andrea Jakubaszko, com o que quer dar visibilidade à sub-bacia do Juruena, mostrando o que tem acontecido nesta bacia com a enorme quantidade de empreendimentos hidrelétricos “que, apesar de, em sua maioria serem considerados de pequeno porte por produzirem até 30 MW, causam severos impactos se construídos de forma sequencial e sem estudos suficientemente completos, como tem sido o caso das usinas em operação no Alto Juruena e da PCH Bocaiúva, no rio Cravari, por exemplo” diz Andreia Fanzeres. A Bocaiúva, localizada a 30 km da Terra Indígena Manoki, foi uma usina instalada sem contar com a participação dos indígenas no início do processo, violando os direitos de consulta livre, prévia e informada, estabelecido na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), tendo um projeto considerado tecnicamente fraco, que se mostrou prejudicial também economicamente, uma vez que a vazão do rio foi superestimada e hoje não há água para girar todas as turbinas.
Só na bacia do Juruena “contabilizamos mais de 100 empreendimentos hidrelétricos, dos quais cerca de 85% estão localizados em rios que passam por dentro de áreas protegidas ou fazem limites com esses territórios”. Mas, no Juruena, aproximadamente 80% de tudo o que já foi inventariado ainda não saiu do papel. “Nutrimos uma esperança de que tanto o governo como os diversos setores da sociedade que podem participar do processo de planejamento energético devem aprender muitas lições com os empreendimentos que já existem, com os processos de licenciamento que já passaram, com os impactos que já estão sendo vividos por diversas populações, para que seja possível garantir a integridade do Juruena e a saúde da bacia do Tapajós”, afirma.
O livro está disponível gratuitamente para download aqui e o vídeo da audiência pública no link.
Representantes indígenas e de comunidades participaram do lançamento do livro em Brasília.
Foto de Sucena Resk/ICV
Fonte: OPAN – http://amazonianativa.org.br/Noticias/OCEKADI-licoes-no-Tapajos,2,397.html