Cientistas da Unicamp identificaram ‘cicatriz geológica’ de 10 km de diâmetro em região árida do sul do Estado
Depressão circular tem muitos traços típicos de impacto extraterrestre, e data parece bater com a da extinção dos bichos
Divulgação | ||
Região da cratera piauiense |
SABINE RIGHETTI
DE SÃO PAULO
Um grupo de pesquisadores da Unicamp achou evidências de que uma cratera circular no Piauí, formada pelo impacto de um meteorito, pode ter sido gerada na mesma época em que ocorreu a extinção dos dinossauros.
O impacto teria marcado o final do período Cretáceo, há 65 milhões de anos. Se a hipótese se confirmar, a cratera piauiense teria surgido no mesmo período que a de Chicxulub, no México -colisão que é a causa mais aceita para o sumiço dos dinos e de mais de 70% da biodiversidade da Terra naquela época.
A equipe da Unicamp analisou a estrutura circular de Santa Marta, em Gilbués, no Piauí, para estudar sua origem e o processo de degradação de terras da região.
O Brasil -assim como toda a América do Sul- tem poucas estruturas de impacto de aspecto circular comprovadas. “Mas há um conjunto significativo de estruturas circulares conhecidas que carecem de investigação”, explica o engenheiro geólogo Carlos Roberto Souza Filho, coordenador do trabalho.
CONJUNTO DE PISTAS
Para os pesquisadores da Unicamp, Santa Marta reúne muitos elementos que corroboram sua origem por impacto de meteorito.
“Encontramos praticamente todas as feições macroscópicas, como cones de estilhaçamento, e microscópicas, como deformações em quartzo, que sinalizam a passagem de ondas de choque e a deformação de materiais relacionadas a um impacto.”
Os pesquisadores notaram ainda que a desertificação da região pode ter sido causada pela colisão do bólido.
“As rochas estão fragilizadas em virtude de denso fraturamento [causado pelo impacto]. Essas fraturas parecem ter potencializado a erosão, o que pode ter contribuído fortemente para o amplo processo de degradação de terras”, analisa o engenheiro geólogo Juliano Senna, que também é da equipe.
As rochas mais novas atingidas pelo meteorito correspondem a sedimentos depositados na região no final do período Cretáceo.
Isso significa que há uma possibilidade de que o meteorito que formou Santa Marta esteja na mesma janela temporal do impacto que criou a cratera de 180 km de diâmetro de Chicxulub. Se a hipótese for comprovada, a cratera do Piauí será a única até hoje identificada no hemisfério Sul formada no mesmo período da famosa cratera mexicana.
PANCADARIA
Essa identificação temporal é importante porque uma das hipóteses em debate hoje em dia considera que o impacto no México pode ter sido acompanhado por outros simultâneos em várias regiões da Terra.
“Mas ainda estamos no campo da especulação. Muitas análises sofisticadas sobre as amostras coletadas no campo serão necessárias para que tenhamos alguma confirmação dessas hipóteses”, enfatiza Souza Filho.
“Essa é uma investigação demorada, de geoquímica de precisão, que depende de métodos específicos e bastante onerosos”, complementa Juliano Senna.
O trabalho de Souza Filho com crateras formadas por impactos de meteoritos já tem uma década.
Em 2002, ele publicou um artigo na revista “Science” sobre os impactos na Argentina, onde há o quinto maior campo de tectitos (“vidros” gerados pela colisão de meteoritos) do mundo.
Agora, os cientistas submeteram o trabalho sobre a cratera Santa Marta para revistas especializadas em geologia e ciências planetárias.