Manifestantes se reuniram recentemente sob chuva diante do Centro de Convenções da ONU em Bancoc, gritando palavras de ordem e criticando países pelo pouco engajamento manifestado na negociação de um tratado para reduzir os gases-estufa. No interior do prédio, profissionais sentados em cafés sorriam para rostos conhecidos e trocavam apertos de mão. Mais tarde, eles se reuniriam a portas fechadas em um conclave dominado por representantes das maiores empresas energéticas do mundo.

Bem-vindo ao mundo das “Bingos” (Organizações Não-Governamentais da Indústria e Negócios), que há anos exercem um papel na moldagem do debate global sobre clima. As conversas em Bancoc foram uma de várias sessões preparatórias para as negociações formais, que terão início em Copenhague em 7 de dezembro, cujo objetivo é firmar um novo tratado global de limitação das emissões de carbono.

No centro de conferências em Bancoc, várias dezenas de executivos de Bingos se reuniram para transmitir informações uns aos outros sobre pontos de alta importância, como as metas globais de redução de emissões, o número de créditos de carbono e os cronogramas para a implementação.

Mas, enquanto a agenda de mudanças climáticas das Bingos parece ser clara, sua estratégia é mais difícil de decifrar. E os resultados de seus esforços com frequência são impalpáveis. O que fazem não é lobby no sentido usual do termo. “O que fazemos aqui é fazer hora”, diz John Scowcroft, da União Europeia da Indústria de Eletricidade. “É fazer hora com uma finalidade.”
Em Bancoc, as sessões de briefing foram conduzidas por um químico britânico chamado Nick Campbell, lobista da empresa química francesa Arkema. Campbell vem assistindo às negociações climáticas da ONU desde 1991, mas diz que limita a atuação de seu trabalho de lobby propriamente dito aos níveis nacional e regional, incluindo a União Europeia.

“Como Bingo, o efeito que você pode ter nestes encontros é pouquíssimo”, ele explica. “A única maneira pela qual pode influir é se puder convencer uma delegação que interessa a ela que suas instruções digam isso ou aquilo.” Como fazem outros representantes de Bingos, ele espera que seus esforços atuais resultem em alguma influência sobre qualquer texto que venha a ser acordado no encontro de Copenhague.

Houve uma época em que os executivos de indústrias que emitem muito CO2 negavam estar contribuindo para as mudanças climáticas. Mas, à medida que o consenso científico foi se fortalecendo e a opinião pública e dos governos foi mudando, as empresas começaram a modificar sua abordagem.

Transição
“Há poucas empresas que ainda fazem lobby aberto contra a regulamentação”, diz Irja Vormedal, pesquisadora da Universidade de Oslo que estuda a influência das indústrias sobre as negociações climáticas. “Agora elas estão tentando preparar-se para essa nova transição. Elas dizem: “Se fizermos isso, teremos uma cadeira à mesa e poderemos influenciar a regulamentação”.”

Representantes industriais dizem que no coração da estratégia atual da “Big Carbon” (os grandes emissores de carbono) está o reconhecimento de que são necessários, sim, controles sobre as emissões. Embora reconheçam a necessidade de descarbonização, representantes industriais conseguiram convencer governos e delegações nacionais a usar linguagem que pode atrasar a implementação do acordo. Muitas associações de indústrias de carbono intensivo -entre elas as do carvão, petróleo e empresas elétricas- buscam metas de redução de emissões de longo prazo, em lugar de metas para o curto prazo.

Elas querem que os governos lhes forneçam gratuitamente parcelas fartas das verbas de que vão precisar para descarregar carbono, pelos termos do tratado. E querem a maior liberdade de ação possível para “contrapor-se” a emissões, em lugar de reduzi-las, através de investimentos em projetos de custo mais baixo em países em desenvolvimento, como projetos de reflorestamento.

Concessões necessárias
Eles também estão pressionando para a ONU incluir como uma dessas medidas aprovadas de contraposição quaisquer investimentos que venham a fazer na tecnologia ainda incipiente conhecida como captura e armazenamento de carbono -um processo controverso pelo qual emissões de carbono (sobretudo de usinas termelétricas movidas a carvão) seriam capturadas e armazenadas no subsolo.
]E elas fazem lobby para que todas essas concessões sejam vistas como necessárias, em vista das desvantagens que afirmam que vão enfrentar enquanto o tratado climático continuar a operar como operou no passado -com países em desenvolvimento, como China e Índia, não sendo obrigados a limitar suas emissões.

Kate Willson
Folha de São Paulo