O PRESIDENTE Luiz Inácio Lula da Silva estará amanhã nos Alpes suíços, quando deve receber do Fórum Econômico de Davos o prêmio de “Estadista Global”, a ser entregue pelo ex-secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan.

Anteontem, o presidente brasileiro participou da 10ª edição do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. Aclamado por cerca de sete mil pessoas no ginásio do Gigantinho, o petista aproveitou o ambiente para atacar o encontro que deve homenageá-lo 72 horas depois: “Eu tenho consciência de que Davos não tem mais o glamour que eles pensavam que tinham. Eu tenho o que mostrar”.

A facilidade com que Lula transita entre os ambientes de Davos e de Porto Alegre é digna de nota. Por um lado, ela é um sintoma da personalidade macunaímica do presidente; por outro, não deixa de ser o reconhecimento de que Lula hoje vocaliza aos olhos da comunidade internacional a possibilidade de um desenvolvimento capitalista com face humana.

O encontro de Davos, nas suas origens frequentado exclusivamente pelos grandes atores do mundo das finanças e da produção, com o tempo foi incorporando demandas que lhe eram estranhas. Pressões variadas e mesmo um certo sentimento de culpa do mundo rico diante das assimetrias sociais acabaram aproximando Davos de bandeiras do chamado terceiro setor. Bem antes da crise econômica, problemas relacionados à pobreza, ao ambiente, à regulação internacional do capital começaram a ter espaço ali.

Essas transformações são mais ou menos contemporâneas da emergência dos movimentos antiglobalização, que teve nos protestos de rua de Seattle, nos Estados Unidos, em 1999, seu marco simbólico.

O Fórum Social Mundial nasceu em 2001, imerso na atmosfera de crítica ao liberalismo, em franca oposição a vários governos latino-americanos da época. A recepção calorosa dada a Lula anteontem mostra como as coisas mudaram.

O fato não deixa de expor os impasses de um movimento que nasceu com disposição crítica e oposicionista e hoje serve como palco de aclamação de governos, os quais, aliás, empregam muitos funcionários da utopia.

Há uma certa descaracterização dos fóruns, um esvaziamento de suas vocações originais. Mas esse seria também um ambiente propício para que, desfeitas ilusões de lado a lado, pudesse prosperar um debate menos ideológico e mais substantivo acerca de tantos problemas e desafios econômicos e sociais do mundo real.