NUM GOVERNO mais dado às metáforas do futebol que às do basquete, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, exerce as funções de pivô. Nem sempre suas jogadas espalhafatosas pelo centro da quadra resultam em pontos, mas ele ao menos sua o colete na posição de articulador abandonada por Dilma Rousseff, ministra-chefe da Casa Civil, mais ocupada com seu próprio PAC (programa de avanço da candidatura).
Minc parece ser o único ministro na Esplanada ocupado em fazer o governo sair da defesa e da troca de passes em duas partidas decisivas para o desenvolvimento econômico e a imagem internacional do Brasil: Código Florestal e aquecimento global. Uma depende do resultado da outra. Lula é aguardado como herói em Copenhague, mas sairá de lá vaiado se tropeçar na primeira ou empatar na segunda.
Embora nada esteja de fato combinado com os “russos” do Planalto, o ministro se empenha por formular propostas capazes de reabrir o debate entre ruralistas e ambientalistas sobre como conciliar agropecuária com preservação de florestas. Do jeito que está, o código não é seguido. Lutar por sua manutenção é optar por uma medição de forças em que a natureza quase sempre sai perdendo.
De assentados a latifundiários, incontáveis agricultores descumprem as regras do jogo -como a manutenção de uma reserva legal de 80% (floresta amazônica), de 35% (cerrado na Amazônia) ou de 20% (outros biomas) da propriedade- pelo menos desde 1965, quando foi revisto o Código Florestal de 1934. Não admitem, entretanto, receber o cartão vermelho prometido para 11 de dezembro, véspera da fase decisiva da Conferência de Copenhague. Nessa data eles deveriam regularizar a situação de fazendas e sítios ou assumir o passivo ambiental.
O Ministério da Agricultura e a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), embora falem em desmatamento zero da boca para fora, defendem na prática o anacrônico direito de desmatar. Ruralistas usam como álibis a segurança alimentar e a balança comercial. Estão condenados a melhorar ainda mais a produtividade, sob pena de cair para a segunda divisão, reservada aos exportadores líquidos de capital natural.
A tendência do presidente é prorrogar a partida por seis meses. Minc quer concessões já, mas fixa limites para a regularização: nada de anistia para desmate ilícito nem de reduzir a reserva legal na Amazônia para os 50% que vigoravam antes de 2001.
O ministro entendeu melhor que o presidente o que os espera em Copenhague. Não se satisfaz com a meta de reduzir 80% do desmatamento na Amazônia até 2020, mera extrapolação da tendência de queda dos últimos anos. Espera-se mais do Brasil em termos de corte nas emissões de gases do efeito estufa (o desmate responde hoje por mais da metade delas).
Minc luta às claras por metas ambiciosas. Com isso, faz mais inimigos no governo, do Itamaraty ao Ministério da Ciência e Tecnologia, adeptos da retranca nas negociações internacionais sobre mudança climática. Sem um jogador encrenqueiro como ele no meio de campo, o governo Lula só poderia contar com a repescagem no campeonato mundial do desenvolvimento limpo.
Marcelo Leite
Folha de São Paulo