Maria Carla Borba
Representantes do Ministério do Meio Ambiente (MMA) seguiram na sexta-feira (28/10) para Nairóbi, Quênia, para participar da terceira reunião de negociação da Organização das Nações Unidas (ONU) que elabora o texto da convenção do mercúrio, prevista para ser lançada em 2013.
Na bagagem, eles levam algumas posições técnicas a serem debatidas, negociadas e aprofundadas a fim de definir o posicionamento do Brasil e colaborar com a finalização do documento juridicamente vinculante (convenção) sobre o controle e o banimento do uso do metal em produtos e em processos nas áreas industrial, mineradora e da saúde.
Em princípio, o governo brasileiro defende a eliminação gradativa (phase out) do uso do elemento químico em processos e produtos, com prazos para os países elaborarem e pôr em curso os Planos de Implementação com vistas à erradicação do uso. Todavia, até mesmo a defesa dessa posição ainda está em construção em virtude da necessidade de uma avaliação mais aprofundada do assunto.
Apesar de ser reconhecido como altamente tóxico, poluente e responsável por contaminação de solo, água e ar e por catástrofes com mortes de grande número de pessoas e de animais, em várias regiões do mundo ele é considerado essencial para vários setores da cadeia produtiva.
Por isso, o abandono do uso do mercúrio é tema polêmico, seu uso é defendido em vários países e sua erradicação ainda encontra resistência e todas as decisões que envolvem sua redução ou banimento geram grandes debates. Essa situação fica bem nítida quando os países se reúnem para discutir normas e diretrizes da convenção das Nações Unidas sobre o mercúrio.
Posição do Brasil – Representante do MMA na reunião e diretora de Qualidade Ambiental na Indústria da Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do MMA (DQAI/SRHU/MMA), Sérgia Oliveira disse que o Brasil defende a adoção dos Planos de Implementação para todos os países a fim de que o uso do metal seja reduzido e controlado.
Segundo a diretora, eles são necessários porque constituem instrumentos de planificação da redução gradual do uso do mercúrio, ou seja, possibilitam aos países a adaptação às normas definidas na futura convenção e a quantificação do uso do metal na cadeia produtiva para identificar o quanto se vai investir em termos de recursos financeiros no processo de eliminação. Ela espera que “esta terceira reunião de negociação defina pontos extremamente relevantes para além das questões técnicas, em especial aspectos de financiamento que vão prover apoio aos países no atendimento às obrigações decorrentes dessa futura convenção”, afirma.
O técnico especializado em segurança química do MMA e também representante do Brasil na terceira reunião, a qual começou na segunda-feira (31/10) e termina hoje ( 4/11), Otávio Maioli, disse que a tendência do Brasil é defender a redução e o controle do uso do mercúrio e que, em Nairóbi, os representantes do País vão manifestar-se favoravelmente a um texto mais rígido em relação às emissões de mercúrio em água e solo. Vão ainda se posicionar contrários à proposta de categorização dos países emissores de mercúrio na atmosfera.
O Brasil é contra essa categorização porque não dá para mensurar com precisão essas emissões e, além disso, a própria categorização fere princípios e diretrizes da Eco 92, realizada no Rio de Janeiro no início da década de 1990, explica Maioli.
Desafio A supressão do uso do mercúrio nos processos industriais e, sobretudo, na mineração artesanal, bem como no setor de saúde, é um desafio para os países, incluindo aí o Brasil, que já eliminou o uso do mercúrio em vários processos e produtos. É que a substância acompanha a evolução industrial da humanidade desde a Antiguidade Grega. Ele foi um dos primeiros elementos químicos identificados na natureza e estudados no mundo.
Descoberto na Grécia antiga, o mercúrio era usado na mineração do ouro. Os gregos o chamavam de hidrargírio – hydra (água) + argyros (prata) – ou água-prata, e, até hoje é usado, tradicionalmente, para minerar ouro e fabricar produtos.
Na área da saúde, ele compõe termômetros, barômetros, lâmpadas, medicamentos, espelhos, detonadores, corantes, amálgama para dentes, dentre outros. O mercúrio é um dos principais elementos para fabricação de todo tipo de produto de limpeza porque faz parte do processo de fabricação do cloro. Todo esse uso, contudo, é passível de substituição e o Brasil é um dos países que demonstram essa possibilidade.
A maior prova é a conscientização do setor industrial cloro-álcali brasileiro. Segundo Maioli, há algum tempo e paulatinamente, “as indústrias cloro-álcali do Brasil, que produzem cloro para fabricação de produtos de limpeza, vêm substituindo o mercúrio pelas chamadas membranas”, disse. Na área de saúde, o País também vem eliminando pouco a pouco o uso do metal: o mercúrio não integra mais, por exemplo, a fórmula de medicamentos como os antissépticos.
O Ministério da Saúde, por sua vez, discute a adoção do phase-out para substituição de uso do metal em equipamentos e medidores, como termômetros e outros, e em amálgamas dentárias, em que é largamente usado. Maioli disse que informações de uma Nota Técnica do Ibama dão conta de que entre julho de 2010 e julho de 2011, da quantidade de mercúrio que o Brasil importou, 47% foi destinado ao setor cloro-álcali para produção do cloro e 43% (cerca de cinco toneladas), para fabricação de amálgama dentário.
A perspectiva do governo brasileiro é a de que surjam ainda soluções para a substituição ou redução do mercúrio na mineração artesanal de ouro. Na área da saúde, o timerosal substância que tem em sua fórmula o elemento mercúrio, usada como conservante em alguns medicamentos e em vacinas multidose ainda é defendido como de uso essencial. O timerosal não é considerado perigoso pela Organização Mundial da Saúde (OMS), informa Otávio Mioli.
MMA e o diálogo no Brasil e na ONU Interlocutor e ponto focal das Nações Unidas para a convenção do mercúrio no Brasil, o MMA articula todas as propostas do País entre os setores envolvidos e a ONU. Um Grupo de Trabalho Técnico sobre Mercúrio (GT Mercúrio), criado pela Comissão Nacional de Segurança Química (Conasq), tem orientado o MMA na elaboração das propostas do Brasil.
O GT reuniu-se pela primeira vez em janeiro deste ano. O terceiro encontro ocorreu em setembro e contou com a participação do presidente do GT de Negociação da ONU. O GT Mercúrio da Conasq é formado por representantes dos Ministérios das Minas e Energias (MME), Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), Relações Exteriores (MRE), da Saúde (MS), setor industrial (representado pela Associação Brasileira da Indústria de Álcalis, Cloro e Derivados – Abiclor), universidades, organizações não-governamentais (ONGs), representados pelo Fórum Brasileiro de ONGs para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (FBOMS) e a Associação de proteção ao Meio Ambiente de Cianorte (APROMAC) e Central Única dos Trabalhadores (CUT).