O Oriente Médio entra em crise, preço do petróleo vai às alturas e leva a economia global à recessão. Essa foi a trajetória das crises passadas. Seria o caso desta vez?
Ainda sob o ruído dos protestos nas ruas dos países do Oriente Médio, é impossível prever o desdobramento de todas as revoltas que começaram na Tunísia há pouco mais de dois meses. Não está descartada a hipótese de que alguns regimes caiam nas mãos de muçulmanos radicais, outros fiquem com o Exército e até — por que não? — que um civil laico seja eleito de forma democrática. Ninguém sabe. Mas uma coisa é certa: nenhum novo governante da região prescindirá do petróleo.
Sem o ouro negro, a receita dos países produtores do Oriente Médio despenca, o desemprego explode, a economia afunda e, com ela, qualquer regime desmorona. Até a rede terrorista Al Qaeda tinha um plano para o setor quando lançou sua guerra ao Ocidente nos anos 90. Por isso, é improvável que o mundo enfrente — no longo prazo — escassez de petróleo por causa da instabilidade política na região dona de dois terços das reservas mundiais. Só que, como dizia lorde Keynes, no longo prazo estaremos todos mortos. Vivemos no curto prazo — e, nele, o risco de um novo choque do petróleo é um espectro cada vez mais presente.
A interrupção do fornecimento, ou o temor de que isso ocorra, tira o sono de governantes e empresários de todo o mundo. As últimas cinco recessões globais foram, todas elas, precedidas de altas agudas e repentinas no preço do barril. No final dos anos 70, com a queda do governo no Irã, o petróleo subiu mais de 200% em questão de meses. Agora, com a súbita alta de 22% no preço do barril em 2011, todos se perguntam se estamos vendo a reprise do mesmo filme.
Uma alta intensa e continuada seria um problema para os usuários dos mais de 800 milhões de carros que circulam pelo mundo. Dor de cabeça para os passageiros dos 350?000 aviões que fazem parte da frota global. E uma péssima notícia para quem depende da comida e dos demais produtos transportados por mais de 19 milhões de caminhões — isso sem falar na produção de adubos, plásticos e derivados. “Quando o assunto é a commodity mais importante na matriz energética mundial, o aumento do preço tem o poder de reduzir o consumo e jogar a economia na lona”, diz Michael Lynch, presidente da consultoria Strategic Energy & Economic Research e ex-diretor de energia do Centro de Estudos Internacionais da prestigiosa universidade MIT.
Qual é o perigo de que a economia mundial entre de novo em forte desaceleração? A pergunta de 62 trilhões de dólares (a soma do PIB mundial) está sendo estudada pelos departamentos de pesquisa de todas as instituições financeiras relevantes do globo. Ao examinar a capacidade da economia global de absorver um novo choque, o banco francês Société Générale trilhou um caminho original. Voltou no tempo para calcular o peso do petróleo nos períodos mais críticos das últimas quatro décadas. Logo após o segundo grande choque, no final dos anos 70, a soma de tudo o que era gasto com a compra de petróleo era equivalente a 9,5% do PIB mundial.
Em meados de 2008, quando o barril atingiu 136 dólares, o percentual era 6,3%. Hoje, mesmo depois da recente elevação, a conta representa 4,2%, portanto, ainda bem distante do caos. “Para chegar a uma crise comparável à dos anos 70, o barril teria de pular para 200 dólares. Para se igualar à de 2008, deveria atingir 136 dólares”, diz Véronique Riches-Flores, chefe do departamento de pesquisa do Société Générale. No fechamento desta edição, o preço do barril estava em 116 dólares.
Fonte: Revista EXAME