O aquecimento global aumentará o número de migrantes em todo o mundo e exigirá de todos os países que estejam preparados para dar condições de vida dignas a essas populações. O alerta consta do relatório mundial do UNFPA (Fundo de População das Nações Unidas), divulgado ontem.
O documento também defende mais investimentos em saúde reprodutiva, para que cada família tenha melhores condições de planejar, livremente, o número de filhos desejados. Uma população crescendo em ritmo menor é um dos fatores que podem contribuir para desacelerar o aquecimento global.
Apesar de não haver estatística sobre o número de pessoas que já se deslocam por consequências do aquecimento global, o relatório diz não haver dúvidas de que esse é um movimento crescente. Nas duas últimas décadas, diz o texto, os registros de desastres naturais passaram de cerca de 200 por ano para mais de 400. Sete em cada dez dessas tragédias foram, de alguma maneira, relacionadas com o clima. Elas afetam por ano cerca de 211 milhões de pessoas, número que só tende a crescer.
Segundo o relatório, o mais provável é que esses movimentos migratórios ocorram dentro dos próprios países ou em zonas de fronteiras. É o que já está acontecendo, por exemplo, com populações que dependem de geleiras tropicais em países andinos. Essas montanhas, que acumulam gelo em seus cumes, são responsáveis pelo abastecimento de água, pela agricultura, e geração de energia em várias cidades da Bolívia, Peru e Equador.
O relatório cita como exemplo o ocorrido com a geleira de Chacaltaya, na Bolívia, cujo ritmo de degradação surpreendeu os cientistas, ao ponto de hoje praticamente não haver gelo ou neve em seu topo.
Esse fenômeno já afeta populações de pequenas cidades ao redor dos glaciares, mas certamente não ficará restrito somente a elas, já que grandes cidades, como La Paz, também dependem da água gerada por glaciais tropicais. “É uma pena não podermos mais esquiar em Chacaltaya, mas o mais grave é que dele dependiam populações que estão tendo que se adaptar a nova realidade”, diz José Gutiérrez Ossio, cientista boliviano que integra o Projeto de Adaptação ao Impacto do Retrocesso Acelerado dos Glaciares.
Vulnerabilidade feminina
O relatório pede também mais atenção dos governos às questões de desigualdade entre homens e mulheres, que poderão ser agravadas pelo clima. Por serem mais pobres, por constituírem maioria dos trabalhadores agrícolas em vários países e por terem dificuldade de migrar em caso de tragédias ambientais por serem mais responsáveis pelos filhos, as mulheres, segundo o Fundo de População das Nações Unidas, são mais vulneráveis aos impactos do aquecimento do planeta.
Outro alerta que o relatório faz é para o aumento de doenças causadas pelo aquecimento global. Um dos exemplos citados -e que afeta o Brasil- é o provável aumento da população vulnerável a doenças transmitidas por mosquitos.
Como as temperaturas vão se elevar, epidemias como as de dengue afetarão cidades que, por estarem em altitudes mais elevadas ou em climas mais frios, antes não sofriam os efeitos dessas doenças.
Folha de São Paulo