Enquanto escutava o hino nacional, as lágrimas corriam no rosto de Petrucio Ferreira. A boca tremia, a medalha de meio quilo pesava no pescoço de uma forma prazerosa. No topo do pódio dos 100m T47 (amputados), na manhã deste domingo (11.09), no Estádio Olímpico do Rio 2016, o Engenhão, ele recordou o choro no dia a dia dos treinos, quando pensava em desistir dos últimos tiros, e o técnico Pedro de Almeida o lembrava que o esforço final poderia fazer a diferença. E fez muita. O atleta de 19 anos, nascido em São José do Brejo do Cruz (PB), foi campeão com sobra. Terminou a prova em 10s57, melhorando em dez centésimos o recorde que ele mesmo havia batido no dia anterior (10s67).
“Passou um filme na minha cabeça, com tudo aquilo que eu vinha trabalhando, aqueles dias que chorei nos treinos, os dias em que suei bastante, cheguei em casa e quase não conseguia tomar banho de tão cansado. A medalha é a minha recompensa. Subir no pódio, escutar o Hino Nacional ouvindo todo o estádio cantando junto é uma alegria que nem eu sei explicar”, contou.
A vitória com recorde mundial foi também uma redenção após a frustrante ausência no Mundial de Doha 2015, quando uma lesão no músculo posterior da coxa o tirou da competição “Esses 10 centésimos vêm de acordo com esses dois últimos anos em que venho trabalhando focado para chegar nestes Jogos. No ano passado, chorei bastante por estar no Catar e não poder participar do campeonato. Eu falei para o meu treinador que este ano seria o de dar a volta por cima”, disse.
Dos campos para as pistas
O atletismo é parte da vida de Petrucio há dois anos e meio. Antes, como muitas crianças brasileiras, havia tentado o futebol. Mas a explosão nas arrancadas chamou a atenção de um professor de educação física. O caminho para as pistas envolvia a mudança para a capital João Pessoa, e uma segunda mãe o acolheu. A medalha veio exatamente no aniversário de dona Maria Da Natividade, o que deixou a conquista deste domingo ainda mais especial.
“Hoje também é o aniversário da mulher que me apoiou bastante, que me deu um lugar para morar em João Pessoa para poder treinar e me dedicar mais ao esporte. Antes eu não tinha técnico. De uma hora para outra eu mudei do futebol para o atletismo e, quando surgiu a oportunidade, eu não tinha onde morar em João Pessoa. Ela me acolheu”, contou.
dolo, “repórter” e companheiro de pódio
Petrucio conheceu o esporte paralímpico ao ver uma reportagem na TV sobre Londres 2012. Ficou impressionado com as conquistas de Yohansson Nascimento (ouro nos 200m T46 e prata nos 400m da mesma classe). Alagoano de Maceió, Yohansson foi uma inspiração para Petrucio e, neste domingo, também companheiro de pódio: Yohansson ficou com o bronze com a marca de 10s79, mesmo tempo do polonês Michal Derus, que ficou com a prata após a análise do photofinish.
“Estamos juntos sempre, ele passa um pouco da experiência antes das competições, no dia a dia de treino. Até na hora de entrar no bloco, sabendo que estou do lado do Yohansson, me sinto confiante. Se eu não conseguir, ele vai conseguir a medalha”, explicou.
Após a entrega das medalhas, os dois brasileiros foram conversar com os jornalistas na chamada zona mista. Vários gravadores foram apontados para ambos, mas Yohansson não quis apenas responder perguntas. Assumiu a postura de repórter e entrevistou o jovem campeão. “Além da medalha que você vai levar para casa, o que você mais quer levar daqui do Rio para a cidade de São José do Brejo do Cruz, na Paraíba?”, perguntou o alagoano.
“Quero levar a minha alegria e o carinho da torcida brasileira não só para a minha cidade, mas para a vida toda”, respondeu Petrucio. A alegria da torcida é o combustível para ambos, que ainda vão correr os 400m e, juntos, vão disputar também o revezamento 4x100m T42-T47 ao lado de Alan Fonteles e Renato Nunes.
“Ainda quero ganhar a minha sexta medalha, que vai ser do lado do Petrucio no revezamento. Nós corremos amanhã, com a equipe fantástica que a gente tem. Quero muito para dar mais uma alegria ao povo brasileiro”, disse o atleta, que coleciona duas pratas, dois bronzes e um ouro e que vai em busca da sexta medalha em Jogos Paralímpicos.
“Cada medalha é uma história que a gente faz. Tenho um livro em branco e cada competição eu escrevo com as minhas medalhas. É extremamente difícil no esporte paralímpico você passar três ciclos entre os melhores do mundo. Você tem que se superar dia após dia”, afirmou.
Petrucio vai atrás da segunda, para encher ainda mais de orgulho a família em São José do Brejo do Cruz – onde um telão foi montado para que a cidade pudesse acompanhar as provas – e todos os brasileiros. O menino do interior da Paraíba está voando tanto nas pistas que já vislumbra desafios mais ousados.
“Futuramente, espero ter resultados melhores e um dia chegar a correr com os velocistas olímpicos. Posso até imaginar correr o Troféu Brasil de Atletismo com os atletas olímpicos. Como só tem dois anos e meio no esporte e não cheguei ao topo, ainda estou na fase de lapidação”, afirmou.
Mateus Evangelista fica em quarto
Na prova dos 100m T37 (paralisados cerebrais), o brasileiro Mateus Evangelista terminou na quarta colocação. Para o velocista de Porto Velho (RO), o pódio escapou no início da prova. “Se você não acerta no início, acaba prejudicando a prova completa. Depois, consegui reagir bem, mas não atingi a minha velocidade máxima”, analisou.
Na próxima terça-feira (13.09), Mateus encara a prova de salto em distância, sua especialidade. “Agora, é apagar esse prova e descansar, porque na terça vou disputar a minha principal prova. Estarei mais concentrado no salto para conseguir uma boa marca e buscar medalha”.
Mais finais
Fábio Bordignon – prata nos 100m T35 (paralisados cerebrais) – garantiu mais uma final para o Brasil. Nos 200m rasos T35, o brasileiro avançou com o tempo de 26s22, segunda melhor marca na classificatória. Nos 1500m T11 (deficientes visuais), Odair Santos – prata nos 5.000m na mesma classe – também foi para a final com o segundo melhor tempo (4m05s34).
Fonte: Ministério do Esporte – Brasil 2016