Daniela Chiaretti
O holandês Yvo de Boer anunciou ontem que deixará o cargo de secretário-executivo da Convenção do Clima das Nações Unidas. A decisão não surpreendeu negociadores do acordo climático internacional, mas acontece em um momento crítico, após o fracasso da CoP-15, a conferência de Copenhague, em dezembro. O perfil de seu sucessor, ainda indefinido, pode influenciar o rumo do processo que, este ano, tem outra conferência, no México, em novembro.
“A saída dele não foi uma surpresa e já estava prevista desde meados de 2009”, diz o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, chefe dos negociadores brasileiros. “Na ocasião, ele avisou que ficaria seis meses depois do término da CoP-15”. Para Figueiredo, De Boer “foi um bom secretário e ajudou a impulsionar o tema.” Ele fica no cargo até 1º de julho. Em seguida, irá para a consultoria KPMG como conselheiro global em clima e sustentabilidade.
A bolsa de apostas sobre o próximo secretário-executivo da UNFCCC está aberta. A função é ocupada por nomeação do secretário-geral da ONU, não existe candidatura e, normalmente, é alguém de área política, já que a comunidade científica costuma ser representada no Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, o IPCC. Ontem, especulava-se na ONU que o sucessor de De Boer pode ser alguém com estatura de chefe de Estado, para destravar as negociações do acordo.
“Copenhague não nos deu um acordo claro em termos legais, mas o compromisso político e a direção rumo a um mundo de baixa emissão são avassaladores”, disse De Boer ontem. Esta condição ” pede novas parcerias com o setor empresarial e agora eu tenho a chance de fazer isto acontecer.” Ele assumiu a secretaria-executiva da convenção do clima em setembro de 2006 sucedendo à também holandesa Joke Waller-Hunter, que morreu quando estava no cargo.
Uma forte possibilidade é que cargo seja novamente ocupado por uma mulher – as Nações Unidas procuram ter equilíbrio de gênero nestas funções. Outra ideia é que seja alguém de países em desenvolvimento.
O secretário-executivo não tem função negociadora, mas de facilitador. De Boer não negociava, mas rompia o protocolo do cargo ao manifestar suas opiniões sobre o processo, o que naturalmente desagradava a alguns.
O momento do anúncio de sua saída é delicado. O resultado da CoP-15 foi o frágil Acordo de Copenhague, um acordo político que, se aponta decisões em questões delicadas como finanças e compromissos de redução de emissão, não tem força de lei internacional. Também não foi decisão consensual e, portanto, não tem a força de uma decisão de CoP. Na prática, isto significa que não dá rumo claro. Não tem, também, um secretariado que possa administrar suas demandas.
Neste momento está em curso uma consulta aos países para que se manifestem sobre a necessidade de mais reuniões, este ano, além da única prevista, em Bonn, antes da CoP-16. O grupo dos países em desenvolvimento mais a China, o G-77, disse que sim, mais reuniões são necessárias para facilitar as negociações. A proposta é que possam acontecer em Genebra e em Nova York.
Além da confusão no processo, outro órgão fundamental ao debate, o IPCC, vem sendo alvo de críticas nos últimos meses, desde que ocorreu um vazamento de e-mails de cientistas da Universidade de East Anglia. Ali se levantou a suspeita de dados manipulados. Houve ainda uma série de erros no último relatório do órgão, o que vem dando munição aos céticos da responsabilidade humana no aquecimento global.