A turma da agropecuária está preparando seu posicionamento para apresentar à Rio+20. Ao que tudo indica, mostrará que concorda em carregar a agenda ambiental no campo, assumindo o protagonismo da agricultura sustentável. Chega de levar paulada dos ambientalistas.

Quem coordena as discussões, visando à elaboração do documento oficial, é a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Quatro reuniões já foram realizadas, duas delas em Brasília, uma terceira em Uberaba, com apoio da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), e a quarta em São Paulo, na sede da Sociedade Rural Brasileira. A iniciativa despertou o interesse de lideranças jovens, que se misturaram aos tradicionais representantes do setor para discutir os novos desafios da produção rural. Inusitado.

O texto preliminar da CNA começa afirmando que “a produção de alimentos é interdependente da conservação dos recursos naturais”. Bom começo de conversa. Mais que qualquer pessoa, o agricultor vive próximo da natureza e sabe o quanto dela depende para continuar existindo. A seca já lhe ensinou que a água responde pela vida. E a erosão do solo nunca lhe deixou dúvidas de que conservar a terra protege um patrimônio da Nação.

Firma-se, nos grupos de trabalho, a ideia de que reside na inovação tecnológica, com sua posterior difusão, a chave no processo de transformação rumo à sustentabilidade. As tecnologias vinculam-se à sua época. Antigamente, nem da agronomia se necessitava para abrir florestas e drenar pântanos, expandindo a produção rural pelo trabalho rudimentar, garantindo assim o surgimento das cidades.

Hoje em dia, os dilemas da civilização exigem soluções mais sofisticadas e, certamente, mais complexas, capazes de enfrentar um duplo desafio: o da segurança alimentar e o da crise ambiental. A humanidade já crava uma pegada ecológica acima do suporte natural do planeta, como se emitisse notas promissórias contra o futuro. Ou se regride à época medieval, reduzindo a população e o consumo, algo impensável, ou se aposta no conhecimento para avançar.

O mundo sustentável se alicerçará sobre bases tecnológicas mais evoluídas, porém, certamente, criadas sob paradigma distinto do inerente ao crescimento perdulário forjado desde a Revolução Industrial. Muda o enfoque, tanto no campo quanto na cidade.

Essa crença na ciência se ampara na história da agropecuária brasileira. A melhor lição, recente, encontra-se na técnica do plantio direto. Foi somente quando se desenvolveu tal sistema de cultivo que o fantasma da erosão deixou de apavorar o campo. Copiados da Europa, os sistemas tradicionais de plantio – que exigem aração e gradeação do terreno antes da semeadura – jamais teriam conseguido a proeza de tornar o Cerrado um território marcante no celeiro mundial. Os solos mais arenosos do Centro-Oeste, sujeitos a chuvas torrenciais, ter-se-iam destruído caso se mantivessem as práticas iniciais de sua ocupação.

Exemplos não faltam. Nos ganhos de produtividade que reduzem a pressão sobre novos desmatamentos, na energia renovável do etanol e do biodiesel, na integração da lavoura com a pecuária, na reciclagem de embalagens de agrotóxicos se percebem facilmente as vantagens tecnológicas rumo à sustentabilidade. Nos últimos 30 anos, com o sistema Embrapa “tropicalizando” a tecnologia, a produção de grãos saltou 238%, expandindo a área cultivada em apenas 36%. Show de competência.

Sim, problemas ainda persistem, reflexos da maneira tradicional, e predatória, de produzir no campo. Mas a tendência contemporânea está delineada. O polarizado debate sobre o Código Florestal não deixou dúvidas: ou os agricultores adotam a receita moderna na produção, ou a sociedade os fará, na marra, engolir. Será inescapável pegar o touro ambiental à unha.

A participação do Estado será cobrada no documento que a CNA vai apresentar à Rio+20. Cabe ao poder público incentivar a agricultura sustentável, com maiores investimentos na pesquisa, garantindo boa rentabilidade da produção rural. Utopias animam as consciências. Mas a ecologia não pode esvaziar o bolso do agricultor. Dura realidade.

Ruralistas tacanhos resistem aos novos tempos. Sua posição faz contraponto aos ambientalistas bobocas, que apostam na regressão tecnológica. Ambos os radicais, ruralistas ou ambientalistas, fogem do problema central. Uns, sonhadores, sublimam o trabalho familiar, confundem produção orgânica com má agricultura. Outros, reacionários, se prendem ao passado sem perceber que aprisionam o futuro.

Resolvida, quando estiver, a pendenga sobre o Código Florestal, baixada a poeira, chegará o momento de as mentes abertas se entreolharem com mais respeito e consideração. Chega dessa discussão polarizada, e imbecil, que separa – ao invés de juntar – a agricultura do meio ambiente. Uma não vive sem o outro.

A Rio+20 poderia deliberar que a FAO, seu órgão para a agricultura e alimentação, organizasse melhor esse debate sobre a questão ecológica no campo. Uma aposta na conciliação, não na divergência. Os agricultores brasileiros querem sentar-se com os ambientalistas à mesma mesa. Dialogar com racionalidade, à frente de um interlocutor confiável.

Será que os ecologistas topam, contribuindo para a transformação virtuosa que ensaia o campo, em vez de apenas atirarem pedras na vidraça antiga do ruralismo? Quem, acreditando na mudança, trocará os cômodos holofotes da mídia urbanoide para amassar barro na roça? Qual deles prefere a difícil busca das soluções, verdadeiras, em lugar do discurso fácil, e falso, do holocausto ambiental?

Com a palavra os ambientalistas sensatos.