COP-15COP-15
Durante os 21 dias que passaram em Copenhagen, os dirigentes e parceiros do EUBRA participaram de plenárias como membros da delegação brasileira, organizaram palestras e apresentações, participaram de mais de 10 reuniões, almoços e jantares com ONGs, delegações e dirigentes internacionais, dentro e fora do espaço da convenção. Organizaram um sistema de vídeo-conferência com apoio do governo dinamarquês, do Senado Federal, Senado Verde, DNOCs e BNB, conectando durante 4 dias o espaço do Brasil em Copenhagen com o Senado Federal em Brasília.

Também organizaram uma documentação, análise sobre as posições majoritárias, tendências e desdobramentos da COP 15, cuja síntese está contida no artigo abaixo e 2 textos separados, sobre as conquistas do EUBRA, do Brasil e do Ceará em Copenhagen e uma síntese das principais definições da COP-15.

Trapenhagen – a armadilha do clima (*)

Robson Oliveira, sociólogo

Os países desenvolvidos ajudaram a organizar a 15ª Conferência das Partes (COP 15), realizada pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), em dezembro último. Também incentivaram bastante ida do presidente brasileiro para que ele colaborasse, in loco, a realizar um grande acordo. Lula, reconhecidamente, significava um interlocutor poderoso com todos os países dentro desse processo. Mas a “Trapenhagen”, a armadilha do clima, que nos quiseram empurrar goela abaixo, já começava ali.

COP-15Os países desenvolvidos, ao tempo em que colaboraram em organizar a convenção e mandaram suas delegações para negociar em Copenhagen (Dinamarca), já vinham articulando em segredo um processo sem volta. No segundo dia do evento mundial, descobriu-se que já existia um documento dos países desenvolvidos sinalizando o fim do Protocolo de Kyoto e retirando da ONU as decisões e financiamento para o combate das modificações do clima e passando para a esfera do Banco Mundial, controlado pelos países ricos. Nascia um novo mecanismo de verificação sob a tutela dos países desenvolvidos. O documento ficou conhecido como “texto dinamarquês”, após ter vazado e sido publicado no jornal britânico The Guardian, no dia 8 de dezembro, ainda início da COP 15.

O texto fazia uma divisão tripartite do mundo: países desenvolvidos, capazes e os vulneráveis. Nessa repartição, eles deixaram claro que não querem abrir mão de suas emissões, sua qualidade de vida e privilégios – conquistados nos últimos 200 anos à custa de ocupação, opressão e com de altos índices de emissão de gases poluentes na atmosfera – para permitir que países que ainda estão em desenvolvimento consigam o mesmo.

O encontro ocorreu no auge do inverno, em uma cidade muito cara e longínqua. Além disso, Copenhagen é pequena e não tinha disponibilidade de acomodação para todos. Mas os grandes grupos financeiros e as empresas multinacionais por eles mantidas estavam presentes em todos os lugares, principalmente nas delegações dos países ricos e em seus discursos.

O próprio presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, fez um discurso inconsistente, prepotente e que desrespeitou todas as nações em desenvolvimento e as subdesenvolvidas, quando ele afirmou que o documento assinado pelo conjunto de nações (entre elas o Brasil) era “um mero pedaço de papel”. Mas qual pedaço de papel? Os Estados Unidos nunca assinaram o Protocolo de Kyoto. Que moral eles têm para exigir coisas que nunca quiseram cumprir?

O acordo final assinado em Copenhagen não tem nenhum valor ou efeito. O mundo rachou, devido ao protecionismo. A Europa já está decidida a ter um caminho próprio para suas questões do clima e de redução de emissões. Já na América Latina, a insatisfação. O presidente da Bolívia, Evo Morales, convocou há pouco uma reunião com os países críticos ao esboço formulado na Dinamarca. Já o presidente venezuelano, Hugo Chávez, ameaçou de expropriar todas as fábricas de automóveis japonesas e americanas que não transferirem tecnologias ou não colaborarem com a produção de carros baratos voltados aos interesses da Venezuela. Ele ameaçou ainda desapropriar as fábricas e repassá-las aos chineses.

COP-15Por outro lado, se a “Trapenhagen” dinamarquesa tornou-se um tiro no próprio pé, o Brasil deixou sua marca: levou a segunda maior delegação da COP 15 (cerca de 800 pessoas) – menor apenas que a anfitriã. Os brasileiros mostraram interesse em participar, entender, debater e encaminhar várias ações visando um futuro próximo e outro distante. Isso ficou claro logo no início, principalmente, quando começamos a perceber, com a parcialidade explícita dos dinamarqueses, que o sucesso da Conferência estava comprometido.

O Itamaraty teve, de início, um bom entendimento do cenário complexo que se formava por ali, dando acesso a muitas organizações e entidades brasileiras que passaram a ter maior intimidade com o grande e novo panorama das negociações empresariais e climáticas internacionais. Em maio passado, já em Copenhagen, mas antes da Conferência mundial, já havia ficado claro que grandes conglomerados queriam ter presença decisiva nos rumos da questão climática. Na ocasião, o EUBRA (Conselho Euro-Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável), que também participou do World Business Sumitt for Sustainable Development, percebeu quão forte seria a presença dos grandes conglomerados financeiros e empresariais multinacionais e começou a participar ativamente da organização da participação brasileira.

Além da boa repercussão com as conquistas brasileiras, o País virou centro das atenções com o presidente Lula, que foi unanimidade na COP 15, com um discurso extremamente diplomático e conciliador. Ninguém, mais do que ele, tentou efetivar um acordo e lutou por isso. Todo o Bella Center parou para ouvi-lo, aplaudi-lo e elogiá-lo, inclusive o primeiro-ministro dinamarquês, Lars Lokke Rasmussen, um dos responsáveis pelo fracasso. Lula foi extremamente emocional porque se sentiu traído.

A lucidez e a forca do discurso de Lula fizeram com que nós brasileiros – de qualquer posição política – nos orgulhássemos. Ele deixou claro (falando por quase todos os países em desenvolvimento e subdesenvolvidos) que não abriríamos mão de nossa soberania para verificações externas decididas unilateralmente por europeus e americanos – os maiores responsáveis pelas alterações no clima.

Assim como o presidente Lula, não estivemos em Copenhagen para criminalizar ninguém. Mas não poderíamos esquecer que os países desenvolvidos usaram tudo o que podiam (armas, política, intimidação etc.) para conseguir se desenvolver e conquistar sua qualidade de vida, na maioria das vezes, em detrimento da vida e soberania dos mais pobres. Enquanto nos últimos 200 anos eles cresceram e se desenvolveram, nós ficamos com as mazelas e à mercê de suas esmolas. Assim como o presidente brasileiro, acreditamos que as questões climáticas, a segurança alimentar e o direito/obrigação a um desenvolvimento sustentável para todos os povos da terra estão inevitavelmente ligados.

(*) “Trapenhagen” – Durante o encontro, a Siemens e grandes grupos europeus espalharam por toda a cidade cartazes e outdoors chamando Copenhagen de Hopenhagen (Hope = esperança, em inglês). Mas para os países em desenvolvimento e os subdesenvolvidos, Copenhagen virou “Trapenhagen” (Trap = armadilha, em inglês).

(**) Robson Oliveira também é sociólogo e preside o Conselho Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (EUBRA).

Análise resumida dos fatos importantes explícitos e implícitos da COP 15 (pelo sociólogo Robson Oliveira):
1- Estados Unidos, Inglaterra e a maioria dos países do norte da Europa liderados pela Alemanha querem extinguir o protocolo de Kyoto e criar novos sistemas de verificação e controle das emissões mundiais.

2- Os países desenvolvidos querem que os financiamentos para combater as mudanças climáticas saiam da esfera de influência e controle da ONU e fiquem a cargo do Banco Mundial, que é controlado pelos países ricos.

3- Os países desenvolvidos querem dividir o mundo em 3 categorias de países: os desenvolvidos, os capazes e os vulneráveis. Sendo que os capazes (países em desenvolvimento) não receberão ajuda no novo mecanismo de redução de emissões. E, contrariando ainda mais o espírito de Kyoto, passam a ter metas mais restritivas. Ex: os países capazes terão um limite de emissão até 2050 de 1,44 tonelada per capita e os desenvolvidos, 2,65 toneladas per capita.

4- Os grandes grupos financeiros, através de grandes empresas multinacionais coligadas influenciaram decisivamente para que os governos dos países desenvolvidos assumissem os 3 pontos indicados acima, visando:

a) não ter obrigação de reparação compensação e transferência de tecnologia aos países em desenvolvimento ou vulneráveis;

b) ter acesso ou beneficio direto ou indireto (via parcerias públicas e privadas) aos recursos a serem aportados pelo Banco Mundial aos países vulneráveis,

c) impedir que o crescimento, desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida dos países em desenvolvimento venham ameaçar os mercados, o poder econômico e político e a qualidade de vida dos países desenvolvidos. É importante lembrar que eles, governos e empresas, encontram-se atualmente abalados pela crise econômica e profundamente dependentes dos conglomerados financeiros;

d) controlar metas de emissão, diminuir ações e barreiras nacionais protecionistas, conhecer profundamente os recursos naturais dos países capazes e os vulneráveis com objetivo de facilitar as ações das empresas multinacionais com apoio do Banco Mundial para programas de exploração mineral, florestal e agrícola e infra-estrutura.

5- As grandes ONGs multinacionais ligadas ao meio ambiente, florestas tropicais e as certificadores multinacionais de produtos florestais presentes em Copenhagen estão sendo apoiadas e instrumentalizadas por grandes grupos financeiros e empresas multinacionais coligadas para minimizarem as pressões sobre o volume de emissões de seus países de origem. Também para centrarem suas campanhas nos países em desenvolvimento e vulneráveis visando a redução de emissões, combate ao desmatamento e conhecimento da biodiversidade e potencial econômico das florestas tropicais, principalmente da Amazônia. O objetivo desta ação é colaborar para diminuir o ritmo de crescimento dos “capazes” e poder conhecer e contar com os recursos naturais destes países (a baixo custo) para subsidiar a combalida economia dos países desenvolvidos e garantir a manutenção de seu status econômico (ver nota abaixo como exemplo).

Nota – A produção de celulose na Europa tem custo muito alto devido ao elevado nível de poluição das águas e solo, e também porque o plantio de eucalipto (ideal para produção de celulose) em grandes quantidades é profundamente agressivo a biodiversidade e aos aquíferos locais. Devido a isso, países como Brasil são escolhidos por empresas do norte da Europa para produção de celulose, devido à terra, mão de obra barata, e devido à legislação ambiental flexível. Quer dizer que, no passado, a civilização ocidental trazia os trabalhadores escravos para o trabalho duro nos trópicos e hoje eles trazem apenas o trabalho duro – os trabalhadores já estão aqui.

As conquistas do EUBRA, do Brasil e Ceará em Copenhagen
1- Acordo com grupos chineses para trazer para o Brasil 2 fábricas de Luminárias LEDS (70% mais econômicas) de segunda geração, com controle majoritário de investidores brasileiros, sendo a primeira delas no Ceará. Nesse acordo, o EUBRA passou a ser representante exclusivo para o Brasil e África do Sul dos grupos chineses LED-UNITED. O acordo foi celebrado no espaço brasileiro na COP 15, com a presença do vice-governador do Ceará, Francisco Pinheiro.

2- Acordo o com o grupos de comunicação dinamarqueses, criadores do evento Bright Green, que acontece na Dinamarca envolvendo 200 empresas internacionais de grande porte para promover difusão de tecnologias de desenvolvimento sustentável e eficiência energética. Neste acordo, o EUBRA passa a ser o exclusivo organizador do evento, que virá definitivamente para o Brasil e acontecerá em 2010, no Rio de Janeiro. Em 2011, o evento virá para o Ceará. O acordo celebrado foi apresentado no espaço oficial brasileiro da COP 15, com abertura do embaixador extraordinário para Mudanças Climáticas do Ministério das Relações Exteriores, Sérgio Serra, representantes da Editora Abril, IBM, Embrapa, prefeitura do Rio de janeiro e do vice-governador do Ceará, Francisco Pinheiro.

3- Acordo com grupos italianos, dinamarqueses, holandeses, ingleses, australianos e para:

a) promoção e apoio para investimentos em produtos brasileiros de valor agregado brasileiro na Europa, e Oriente;

b) Missões e encontros para atração de investimentos e promoção de cidades e estados do norte e nordeste do Brasil em 2010 e 2011.

c) apoio italiano para promoção e comercialização de produtos de design nacional produzidos pelo programa Floresta Móbile no Ceará, Pará e Maranhão, durante o Salão do Móvel de Milão em 2010 (os objetos decoraram o espaço brasileiro na COP 15 numa parceria com o BNDES e Fundo Amazônia).