O sucesso demorou a chegar para Susana Baca, a cantora folclórica afro-peruana que há pouco tempo foi nomeada ministra da Cultura no novo governo do presidente Ollanta Humala, do Peru. Ela é a primeira pessoa negra a integrar o gabinete peruano e a primeira cantora no cargo.
Susana Baca tinha 51 anos quando David Byrne a descobriu, em meados dos anos 1990, e incluiu sua versão emocionante de “Maria Lando” em seu álbum de compilação “Soul of Black Peru”.
Ela já gravou seis álbuns no selo de Byrne, Luaka Bop, e sua fama de embaixadora da música afro-peruana junto ao resto do mundo só vem crescendo. Em 2002 ela recebeu um Grammy latino de melhor álbum folk por “Lamento Negro”.
Críticos elogiam a qualidade pungente de sua voz e a maneira como brinca com formas folclóricas, fazendo combinações de ritmos e gêneros diferentes e mexendo com letras tradicionais. Seu novo álbum, “Afrodiáspora”, faz um giro cheio de ritmo pela música de influência africana nas Américas.
Susana Baca, que está com 67 anos, nunca integrou a elite política ou social do Peru, onde as divisões raciais e de classe são profundas. O convite do presidente Humala para chefiar o Ministério da Cultura a pegou de surpresa, no momento em que se preparava para uma turnê no exterior.

P. Conte como a sra. acabou sendo nomeada ministra da Cultura. Sabia, antes da eleição, que essa seria uma possibilidade?
R. Foi uma surpresa enorme. Os ministros da Cultura sempre foram arqueólogos, antropólogos ou sociólogos, mas nunca um artista. Pensei em minha mãe, em como eu teria gostado que ela estivesse viva para saber que sua filha, de origens humildes, que lutou tanto na vida, chegou a ocupar um cargo tão importante neste país.

P. A senhora nunca frequentou os círculos do poder em seu país. Quando era criança, era possível uma mulher negra sonhar em se tornar ministra?
R. Não, e não apenas quando eu era criança. Faz pouco tempo que conseguimos ser respeitados, ter um status. Existe esta mentalidade nas pessoas comuns, e é algo que vimos nas redes sociais no segundo turno da eleição do presidente Humala. Coisas racistas terríveis foram ditas nas redes. Racismo contra indígenas. Racismo forte. E é triste que neste país ainda haja gente que despreza os negros, os índios e os povos da Amazônia.

P. Fale um pouco sobre o novo álbum. Parece um giro pela música dos africanos nas Américas. Por que a sra. escolheu essas canções?
R. Eu quis mostrar a africanidade da América. Nossa africanidade. Festejar essa africanidade. Foi isso o que aconteceu neste álbum.
Ao escolher as canções, é maravilhoso ver que, quando interpretamos música de Porto Roco, e uma dança bomba parece ser tão nossa -devido ao ritmo-, bem, não é a mesma coisa, mas é semelhante.
O que me emociona tanto é como podemos fazer uma canção funk terminar num “festejo” peruano, e sem perder a autenticidade.

P. Existe alguma faixa neste álbum que seja especial para a sra.?
R. A música de Nova Orleans. Foi importante fazer esse trabalho, porque vivi em Nova Orleans e fiquei conhecendo os músicos de lá, mas não pude começar um trabalho por causa do Katrina. Quando faço esta canção, recordo aquilo que vivi e acho que é uma homenagem ao lugar belo que é Nova Orleans

P. O furacão Katrina a obrigou a partir. Quanto tempo a sra. passou em Nova Orleans?
R. Passei um mês lá. Cheguei para a comemoração do aniversário de Louis Armstrong, e havia muita música, muita comida. Me pareceu que eu estava no paraíso. E então, de repente, chegou o furacão e tudo se transformou.

P. Neste álbum há dois covers de canções da cantora mexicana Amparo Ochoa e da cubana Célia Cruz. Como elas lhe influenciaram? Que influência tiveram sobre sua música?
R. Célia Cruz eu conheço desde que abri meus olhos. Minha mãe a adorava. Eu a via na televisão cantando com o La Sonora Matancera, na época em que cantava com eles. E ela cantava canções em ioruba. Aquilo me fascinava.

P. Como a sra. pensa em conciliar seus deveres como ministra e sua carreira musical?
R. Vai ser muito difícil. Embora eu tenha uma equipe de alto nível trabalhando aqui, acho que o cargo vai consumir meu trabalho como cantora. Mas não pretendo abrir mão da música.

fonte: Folha de Sp