A família que cresceu aos olhos do público se despedia de seu membro mais famoso aos olhos do público. Ontem, o ingresso mais valorizado na cidade que é a meca do entretenimento era para um funeral. Assim, Michael Jackson saía provisoriamente de cena como viveu: estranhamente.
Desde as seis da manhã de ontem, milhares de fãs faziam filas para entrar num ginásio em que havia um palco, telões e até livreto dourado com programação oficial. Havia também um caixão e uma família que velava. Lá fora, no entanto, fãs tiravam fotos, gritavam excitados e davam entrevistas.
Eram grupos, casais e pessoas sozinhas. Na plateia e, antes, nas calçadas, a tribo era inconfundível. Primeiro pela profusão de “Michaels”, de várias raças e ambos os sexos. Tinha Faroh, único nome, cabeleireiro da Indonésia que trabalha em Hollywood (o bairro) e se veste como o ídolo. Tinha Shaar Soulee, maquiadora de Nova Orleans, que se pintou como o músico e trazia balões em forma de notas musicais.
A outra característica a unir todos era a pulseira no braço direito, de diversas cores, dada no dia anterior pela organização do evento e que fez pelo menos 20 mil pessoas passarem a noite sem tomar banho -ou fazer isso com dificuldade. Era o caso da brasileira Ludmila Simões, 18, que mora em Los Angeles, pretende estudar medicina e ganhou o ingresso de um sorteado que desistiu de ir.
“Nem fã de Michael Jackson eu sou, mas você acha que eu vou perder uma dessas?”, perguntava ao repórter. Não. Nem a cantora Andrea Ferraz, de Guaratinguetá (SP), que mora em Los Angeles há anos e abrirá para a cantora Céu na semana que vem. “Parte de minha formação musical foi crescer ouvindo “Thriller'”, disse ela.
Nem o ativista religioso Jesse Jackson, que disse à Folha que “Michael amava a música brasileira” e que “os dois países, Brasil e EUA, se unem pela música”. Ou Steve Manning, amigo do músico por 40 anos e seu ex-assessor de imprensa, que disse que Jackson pretendia voltar ao país, onde esteve duas vezes, sozinho e com os irmãos.
No ginásio
“Michael gostava de seu país”, disse ele. Manning também, aparentemente, já que deu dois ingressos ao repórter e a um colega brasileiro, ação que os colocou na pista do megafuneral, poucas fileiras atrás dos Jackson. Lá dentro, o clima era menos festivo, o que a decoração toda preta ajudava. Gritos e aplausos eram entrecortados por choros e soluços.
Ainda assim, era um show. Com música, performance e clipes em telões. Com gritos de “I Love You, Michael” e comentários de “Você viu quem está na fileira em frente?”. Era Mike Tyson, ou Brooke Shields, ou Jennifer Hudson.
Mas eram também Katherine Jackson, 79, mãe do morto, e Joe, 80, o pai, a quem ele acusava de o espancar -e que brigam na Justiça pelo controle da fortuna do filho. Os oito irmãos. Os dois filhos, Prince Michael e Blanket, cujo destino ainda será decidido por um juiz. E uma menininha chamada Paris, que o pai fazia questão de esconder da mídia, mas que ontem fez sua estreia mundial.
Era o primeiro show de uma turnê que, como as de Elvis Presley (1935-1977) e John Lennon (1940-1980), não deve acabar nunca mais.
Folha de São Paulo