SERGIO DUARTE


Tem crescido a consciência da necessidade de tratar com maior seriedade da questão nuclear, da qual depende a sobrevivência da humanidade



A eliminação das armas de destruição em massa e a regulamentação dos armamentos convencionais são elementos fundamentais para o fortalecimento da paz e da segurança internacionais.
Apesar dos esforços iniciais imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, a rivalidade, a desconfiança e a hostilidade entre as duas superpotências impediram qualquer progresso no sentido do desarmamento geral e completo.
Desde então, a comunidade internacional se voltou para as chamadas “medidas parciais”.
Durante as décadas seguintes foram estabelecidas zonas livres de armas nucleares na América Latina e Caribe, no Pacífico Sul, no Sudeste Asiático, na África e na Ásia Central e concluídos acordos importantes, como os de proibição de ensaios com explosivos nucleares, primeiro na atmosfera (1963) e depois em todos os ambientes (1996).
Pelo Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), de 1970, os cinco países reconhecidos como possuidores dessas armas se comprometeram a negociar “em breve prazo” e “de boa-fé” medidas “relativas à cessação da corrida armamentista nuclear” e a “um tratado de desarmamento geral e completo”, enquanto os países não possuidores se obrigaram a não adquirir armas atômicas e a aceitar um sistema de controle sobre suas atividades nucleares pacíficas.
Os países nuclearmente armados e seus aliados têm cada vez mais propugnado a adoção de novas medidas restritivas para conter a proliferação e reduzir a possibilidade de que atores não estatais obtenham materiais e armas nucleares para uso em atos de terrorismo.
Ao mesmo tempo, estabelecem condicionamentos, tais como a solução de conflitos regionais e o reforço das medidas de não proliferação, para que lhes seja possível aceitar compromissos mais firmes de desarmamento.
Os países não possuidores, ao contrário, vêm constantemente reclamando medidas juridicamente vinculantes, verificáveis e irreversíveis de desarmamento nuclear e consideram que os possuidores pouco ou nada fizeram, ao longo de 40 anos, para cumprir os tênues compromissos assumidos no TNP.
Muitos não se mostram dispostos a concordar com a imposição de controles adicionais sobre suas atividades, na ausência de progressos reais no sentido do desarmamento.
A divergência fundamental entre essas posturas explica em grande parte a falta de avanços, desde o final do século 20, nos órgãos multilaterais que tratam de desarmamento e controle de armamentos.
Recentemente, contudo, tem crescido em todo o mundo a consciência da necessidade de tratar com maior seriedade dessas questões, das quais depende a sobrevivência da humanidade.
Ex-estadistas influentes, parlamentos, detentores do Prêmio Nobel e organizações da sociedade civil em todo o mundo têm intensificado os esforços para sensibilizar os governos e a opinião pública a fim de tornar realidade essa aspiração de completa eliminação das armas nucleares.
O secretário-geral das Nações Unidas incluiu o desarmamento entre as prioridades da ONU, ao lado de outros temas globais urgentes, como o da mudança do clima.
Caso a humanidade não aja decisivamente, a vida na Terra, tal como a conhecemos, poderá deixar de existir em consequência tanto de mudanças climáticas quanto do uso de armas nucleares. A diferença é que, no primeiro caso, a extinção da vida ocorrerá ao longo de algumas décadas, enquanto para um apocalipse nuclear bastarão apenas alguns segundos.


SERGIO DUARTE é subsecretário-geral das Nações Unidas para assuntos de desarmamento.