Com falta de mão de obra, número de mulheres no setor cresce 74% em 4 anos

Gestores apontam vantagens como responsabilidade, menos ausências e baixo uso de drogas

SHEILA D’AMORIM
DE BRASÍLIA

A falta de mão de obra para atender o boom da construção civil dos últimos anos transformou os canteiros, abrindo espaço para mulheres num reduto tradicionalmente masculino.
Em quatro anos, o número de mulheres que literalmente passaram a colocar a mão na massa aumentou 74%, segundo levantamento do Ministério do Trabalho feito a pedido da Folha.
Em 2007, elas eram 109 mil. Em 2010, chegaram a 189,3 mil. Ainda representam um universo pequeno -7,67% do total de 2,4 milhões de trabalhadores do setor-, mas avançaram em territórios considerados tabus.
Se antes elas estavam apenas cozinhando ou ajudando na limpeza, agora atuam como pintoras, pedreiras, carpinteiras, operadoras de guindastes, caminhões e máquinas pesadas.
A presença feminina é destaque tanto na construção de condomínio residencial com 11 prédios nas redondezas de Brasília como em projetos de infraestrutura, casos das usinas de Jirau e Santo Antônio (RO) e Belo Monte (PA).
Essas três grandes obras ilustram bem a tendência que se espalhou pelo país. Em Santo Antônio, cerca de 10% dos 15 mil que trabalham na obra são mulheres, segundo a Odebrecht, que coordena o canteiro.

CAPRICHO
Em Belo Monte, os trabalhos ainda não começaram, mas a seleção dos primeiros 150 trabalhadores que serão treinados inclui 25 mulheres. “Mulher trabalha com mais capricho, é mais responsável e o número de faltas é menor”, afirma Marcos Sordi, diretor administrativo do consórcio Belo Monte.
Com larga experiência na construção civil, ramo em que atua desde 1975, Sordi diz que elas começaram com funções que exigem mais atenção a detalhes, como soldas e rejuntes, mas, agora, disputam vagas que não eram oferecidas a mulheres.
“Hoje, é comum ver mulheres operando tratores, guindastes e caminhões que transportam terra. E não é só aqui em Belo Monte. Em Jirau, de 20 mil operários, cerca de 4.000 são mulheres.”
Alcione Rodrigues, 25, mora em Altamira e trabalhava como doméstica. Desempregada, inscreveu-se para curso de pedreira de Belo Monte porque o marido já trabalhava na área. Foi aceita.
“Criticaram, mas me inscrevi e levei o marido. Ganharei mais que os R$ 200 que tirava como empregada.”
A piauiense Analina Pereira de Souza, 45, trabalha como pedreira há pouco mais de um ano. Viúva, com nove filhos e a mãe de 86 anos para sustentar, diz que tem “vocação” para trabalho pesado.
“Achavam que não tinha força, mas mostrei que sou capaz.” Era montadora de móveis em Brasília e ficou desempregada. Não teve dúvida quando conseguiu vaga de pedreira num prédio.
Os salários de homens e mulheres nos canteiros de obra se equiparam porque variam de acordo com a função exercida.

ADAPTAÇÃO
“Mulher tem mais visão de qualidade, algumas valem mais do que muitos homens”, diz o mestre de obras Cláudio Silva, 56, destacando que não abre mão de mulheres na equipe. Engenheiro civil, Humberto Navarro, 36, seguiu o conselho de Cláudio. “São mais dedicadas.”
Paulo Safady Simão, presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), defende a presença feminina nos canteiros.
Diz que as empresas precisaram se adaptar criando vestiários e banheiros e considera que esse é um caminho sem volta. Ele reconhece que algumas empresas ainda resistem. “Mas a lei de mercado vai prevalecer.”
Um ponto que pesa contra as mulheres, segundo Sordi, de Belo Monte, são conquistas trabalhistas como licença-maternidade. Além disso, se ficam grávidas durante a obra, precisam trocar de função. Mas, para ele, os benefícios compensam.
“Incidência de alcoolismo e drogas entre mulheres é bem menor.”

fonte: Folha de Sp