Os líderes mundiais que se reúnem para discutir a mudança climática estão diante de um desafio intricado: assinar em dezembro, em Copenhague, um tratado de combate ao aquecimento global num momento em que temperaturas estão relativamente estáveis há uma década e podem até cair nos próximos anos.
Essa estabilização tem sido citada por céticos como “prova” de que a ameaça da crise do clima é exagerada. Especialistas na área temem que isso possa adiar as negociações sobre o tratado e atrasar o progresso de legislações para limitar as emissões de CO2 nos EUA.
Cientistas afirmam que o padrão da última década, após um aumento bastante acentuado nas temperaturas médias globais nos anos de 1990, é resultado de variações cíclicas nas condições dos oceanos e não tem ligação com os efeitos de aquecimento a longo prazo dos gases do efeito estufa que se acumulam na atmosfera.
No entanto, tentar comunicar tais nuances científicas ao grande público e aos responsáveis pela elaboração de políticas públicas sobre clima pode ser frustrante, dizem eles.
Confusão a frio
Mojib Latif, cientista de climas e oceanos, vencedor de prêmios na área, do Instituto Leibniz de Ciências Marinhas da Universidade de Kiel, na Alemanha, escreveu um artigo no ano passado postulando que mudanças cíclicas nos oceanos poderiam manter as temperaturas relativamente estáveis na próxima década, apesar do crescimento da emissão de gases do efeito estufa.
Entretanto, Latif diz ter sido recebido com confusão e raiva quando tentou descrever essa variação normal no clima, mesmo sem negar o perigo do aquecimento global a longo prazo. “As pessoas me entendem, mas depois acabam dizendo: “não acreditamos em nada”.”
Outros climatólogos contestam Latif, dizendo que o clima não pode ser previsto de forma precisa numa escala de tempo tão curta, embora concordem que, uma hora ou outra, períodos de resfriamento ocorrem.
Salientando justamente a existência de pouco esclarecimento em relação às flutuações de temperatura a curto prazo, cientistas britânicos, em artigo publicado em agosto, projetaram “o fim desse período de relativa estabilidade”, com metade dos anos entre hoje e 2015 excedendo as temperaturas globais recordes de 1998. Seja lá o que estiver por vir na próxima década, críticos do aquecimento global não deixam de usar a atual estabilidade na temperatura como argumento para seu ponto de vista.
Recorte cético
“Acho que isso respalda os argumentos dos que questionam qual é a pressa em estabelecer políticas sobre o tema”, disse Patrick Michaels, climatólogo ligado ao Instituto Cato, grupo que se opõe à maioria das soluções regulamentares para problemas ambientais. A recente estabilidade das temperaturas globais aparece regularmente em posts de blogs contestando a realidade do aquecimento global.
Defensores do novo acordo do clima questionam esse raciocínio. Em seu blog Climate Progress, Joseph Romm, físico do Centro Liberal para o Progresso Americano, escreveu que as afirmações por parte de céticos sobre o resfriamento planetário são “nonsense”.
O registro dos últimos anos com temperatura estável é particularmente notável, pois se seguiu a uma oscilação de temperaturas estranhamente frias para outras extremamente quentes na década de 1990, disse Vicky Pope, do Met Office, a agência britânica de clima. A erupção do vulcão Pinatubo, em 1991, nas Filipinas, teve uma influência no resfriamento, pois detritos ejetados bloqueiam radiação solar. Depois, em 1998, um El Niño no Oceano Pacífico deflagrou um período recorde de calor.
A temperatura média global está agora só 0,07C maior que em 1991, diz o Met Office.
Temporadas de tempestades pouco notáveis se seguiram à série destrutiva de 2004 e 2005, que incluiu o furacão Katrina. No Ártico, uma retração extraordinária do gelo marinho no verão de 2007 se seguiu de perdas menores depois.
Ciência contra a inércia
A maioria dos climatólogos está mantendo suas projeções para este século sobre aumento do nível do mar e outros problemas, caso os humanos não tomem as medidas necessárias. Na semana passada, Rajendra Pachauri, presidente do IPCC (painel do clima da ONU) disse em discurso que “a ciência não nos dá espaço para a inércia”.
O artigo britânico, publicado em agosto no “Bulletin of the American Meteorological Society”, reforça Pachauri. Embora conclua que haja uma chance em oito de termos uma pausa de uma década no aquecimento com a atual estabilização (mesmo com crescentes concentrações dos gases-estufa), a chance de ocorrer uma pausa de 15 anos são só de uma em vinte.
Para alguns sociólogos, a vulnerabilidade do público a argumentos dos céticos não é surpresa. Fazer pessoas se importarem com a ameaça climática que está a décadas de distância já é difícil, afirmam eles, sem acrescentar a excentricidade de ciclos climáticos naturais.
Robert Brulle, da Universidade Drexel, diz que o aquecimento global continua sendo uma abstração para muitas pessoas. “Isso não tem o impacto visual ou emocional de ver aves marinhas cobertas de petróleo, como no derramamento do Exxon Valdez”, afirma.
Andrew Revkin
New York Times