Evento foi um manifesto para a sociedade mudar o olhar, acolher a diversidade e conviver sem excluir
Provocar e celebrar. A Cerimônia de Abertura dos Jogos Paralímpicos Rio 2016 foi um manifesto para a sociedade mudar o olhar, acolher a diversidade, conviver sem excluir e viver superando limites. Assim, o estádio do Maracanã virou, na última quarta-feira (07.09), um laboratório multissensorial que transmitiu a mensagem para a população mudar a percepção em relação à pessoa com deficiência.
Com a proposta de aproximar a plateia da realidade dos atletas paralímpicos, o público foi instigado a usar os sentidos. Em outro momento, a união de todos os países formou um grande coração pulsante para transmitir a mensagem: “O coração não conhece limites”.
O espetáculo
A cerimônia, idealizada pelo escritor e dramaturgo Marcelo Rubens Paiva, pelo design Fred Gelli e pelo artista plástico Vik Muniz, começou com uma viagem na história do Movimento Paralímpico. Um vídeo mostrou o berço do paradesporto, iniciado no fim da Segunda Guerra Mundial na pequena cidade inglesa de Stoke Mandeville. As imagens fizeram uma conexão entre a capital britânica Londres e Belém, no Pará, com Sir Philip Craven, presidente do Comitê Paralímpico Internacional, passando pelos locais em sua cadeira de rodas. Em seguida ele chega ao Rio de Janeiro e entra na rampa do Maracanã para, enfim, surgir no meio do público, dando início à contagem regressiva.
Foi neste momento que uma das principais apresentações da noite levantou a plateia: o norte-americano Aaron Wheelz, que nasceu com uma má-formação congênita conhecida como espinha bífida, utilizou sua cadeira de rodas para realizar um feito que poucas pessoas teriam coragem de tentar. O atleta desceu, em alta velocidade, por uma mega rampa de 17 metros (equivalente a um prédio de seis andares) montada ao longo das arquibancadas do Maracanã. No momento em que Aaron Wheelz concluía a manobra, fogos de artifícios foram disparados, iluminando o céu do Rio de Janeiro.
Roda brasileira
A roda foi a primeira homenageada da noite. Ícone universal de mobilidade, ela foi apresentada da forma mais brasileira possível, por meio de um pandeiro dentro de uma roda de samba. O encontro, que representa a cultura nacional, contou com os bambas Monarco, Maria Rita, Pretinho da Serrinha, Xande de Pilares, Hamilton de Holanda, Diogo Nogueira e Gabrielzinho do Irajá.
Em seguida, uma projeção fez o gramado do Maracanã virar uma grande piscina. A imagem do nadador brasileiro Daniel Dias atravessou o palco do futebol mundial no melhor estilo livre. A transformação foi para mostrar um típico dia de praia da Cidade Maravilhosa, com a água da piscina recuando e abrindo espaço para a areia.
A cena proporcionou uma experiência surpreendente ao público, que viu surfistas, banhistas, vendedores e esportistas em diversidade de formas e cores. Um dos personagens mais típicos das praias cariocas, o vendedor de “Mate” fez o galão com chá virar tambor. Após a encenação, o Hino Nacional foi executado pelo maestro João Carlos Martins e os guarda-sóis da praia se transformaram em uma imensa bandeira do Brasil.
“O coração não conhece limites”
Embalados pelo DJ João Brasil, que selecionou uma mistura do ritmo da música eletrônica com ritmos populares para a recepção dos atletas, as delegações começaram a entrar. A primeira foi composta pelos Atletas Independentes, que carregavam a bandeira do Comitê Paralímpico Internacional. No total, 164 delegações com 1.838 atletas encheram o Maracanã.
Ao som de “O homem falou”, de Gonzaguinha, o Rio de Janeiro viu pela primeira vez uma mulher puxar a delegação paralímpica brasileira na Cerimônia de Abertura. Shirlene Coelho, campeã mundial e paralímpica, carregou a bandeira nacional.
Ao lado dos porta-bandeiras, peças de quebra-cabeça com nomes dos países abriam alas paras as equipes. Na outra face das peças, fotos de 6.315 atletas paralímpicos, que foram sendo encaixadas uma a uma no centro do gramado.
Recordista mundial e medalhista de prata (Pequim 2008) e de ouro (Londres 2012) no lançamento de dardo, a goiana entregou a última peça do tabuleiro que formou um coração gigante que pulsou, transmitindo o conceito principal da cerimônia: “O coração não conhece limites”.
Boas-vindas
Os presidentes do Comitê Paralímpico Internacional, Philip Craven, e do Comitê Rio 2016, Carlos Arthur Nuzman, discursaram para o público e trouxeram uma mensagem de boas-vindas aos atletas. “Vocês são super-humanos, não conhecem o impossível. É com imensa admiração que nós dedicamos esses jogos e essa festa a vocês atletas paralímpicos do mundo inteiro. Vocês são nossos heróis. O Rio de Janeiro está pronto para fazer a história paralímpica”, disse Nuzman.
O presidente do Comitê Rio 2016 também destacou a importância do evento para o Brasil e para o mundo. “Celebramos hoje um grande desafio, o desafio de construir um mundo novo. Muito mais acessível e mais fraterno, onde todos possam caminhar lado a lado sem obstáculos”, acrescentou.
Na sequência, Philip Craven destacou os valores do esporte paralímpico, para quem os Jogos têm o poder de encorajar as pessoas a enfrentarem as dificuldades e aprenderem com as diferenças. “Eles veem os obstáculos como oportunidades para fazer do mundo um lugar mais justo. Pelos próximos doze dias vocês vão testemunhar como o esporte paralímpico tem o poder de transformar o individuo para um mundo cheio de possibilidades e oportunidades infinitas”. Após os discursos, o presidente Michel Temer anunciou oficialmente a Abertura dos Jogos Paralímpicos Rio 2016.
Além da visão
Com um espécie de blackout, o público foi convidado a despertar o sentido do tato e ampliar a capacidade de desenvolver novas habilidades quando falta um dos sentidos. Feixes de luz, formação de um olho gigante e dois dançarinos com deficiência visual, Renata e Oscar, se apresentaram sobre a projeção de um piso tátil, evidenciando a importância do uso desse recurso para os deficientes visuais.
A convivência entre o homem e a tecnologia também foi mostrada. A bailarina e atleta paralímpica americana Amy Purdy dançou com o robô Kuka, um braço automotivo.
Bandeira Paralímpica
A bandeira paralímpica foi carregada por nove crianças com diferentes tipos de deficiências e integrantes do projeto Bota do Mundo. Acompanhadas pelos pais, elas deram a volta no estádio e foram aplaudidas durante todo o percurso, que terminou com a passagem da flâmula para o Terceiro Grupamento Marítimo de Copacabana, que hasteou o símbolo.
O projeto Bota do Mundo nasceu através do brasileiro Alexandre Faleiros, um pai que só queria realizar o sonho do filho, deficiente físico, de jogar futebol. Hoje a iniciativa é referência no esporte adaptado.
Pira Paralímpica
Um dos momentos mais aguardados, o acendimento da pira provocou a emoção de quem acompanhou a cerimônia. Após o revezamento em seis cidades brasileiras (Brasília, Belém, Natal, São Paulo, Joinville e Rio de Janeiro) com a participação de 700 condutores, a chama paralímpica chegou ao Maracanã e, já no interior do estádio, foi conduzida por quatro atletas.
O corredor Antônio Delfino de Souza, medalhista de ouro em Atenas 2004 nas provas de 200m e 400m, passou a tocha paralímpica para a também corredora, Márcia Malsar, uma das pioneiras da modalidade no Brasil. Sob chuva, ela seguiu o percurso e mesmo após cair, entregou a chama para a velocista Ádria dos Santos sob sonoros aplausos do público.
Àdria que após seis participações em Jogos Paralímpicos, 537 medalhas conquistadas no Brasil e outras 70 internacionais, se aposentou das pistas recentemente, passou a tocha ao último condutor, o nadador Clodoaldo Silva, dono de 13 medalhas, sendo seis de ouro. Ao receber a chama, o “Tubarão Paralímpico” seguiu rumo à pira, mas se deparou com uma enorme escada, que o impossibilitou de subir sozinho com a cadeira de rodas.
Neste momento, a escada se abriu transformando-se em uma rampa de acesso e emocionando o público. A intenção do Comitê Paralímpico foi justamente causar um momento de reflexão nos espectadores sobre a importância e necessidade de um mundo desenhado para todos.
Fonte: Ministério do Esporte