TANTAS EXPECTATIVAS e dúvidas, mas está decidido: os Jogos Olímpicos de 2016 serão no Rio de Janeiro. Agora, o importante é o que vamos fazer com essa grande oportunidade. Não podemos perdê-la. Somos bons em diversos esportes, não só no futebol. Neste, é consenso internacional que sobramos. Como identidade cultural, só nossa música se iguala ao futebol. O Rio venceu fortes concorrentes. Foi escolhido, apesar da violência, da infraestrutura precária, da rede hoteleira insuficiente (transatlânticos virão para a orla carioca para ampliar a oferta de quartos), do trânsito/transporte, da poluição da baía de Guanabara (um dos compromissos do Pan 2007, com tecnologia e balsas australianas, lembram?), da corrupção, da impunidade (o TCU não engoliu as contas do Pan) e das politicagens em todos os níveis.

Nada disso é novidade hoje, embora seja tudo alarmante. A novidade é o que podemos ganhar com os Jogos. O Comitê Olímpico Internacional e seus investidores exigem muito, cobram resultados, mas também ajudam com segurança, turismo, saúde, educação, meio ambiente. Com essa gente, não tem brincadeira. Os interesses são enormes, e prazos, metas, orçamentos e compromissos têm que ser cumpridos. Uma boa oportunidade para o Brasil experimentar coletivamente novos conceitos, melhores valores e mentalidades. A Constituição diz que o esporte é direito do cidadão e dever do Estado.

Que os governantes respeitem a Constituição para que o legado dos Jogos (o do Pan 2007 foi lamentável) se traduza em benefícios para a população, principalmente para seus segmentos mais necessitados, tão carentes de oportunidades e políticas públicas de inclusão social. A FGV fez estudo e projetou resultados animadores: os Jogos de 2016 no Rio podem repercutir em todo o Brasil até 2020, pelo menos. Isso, claro, se as coisas forem bem feitas. Como prevê o COI: avaliar, planejar e investir no curto, médio e longo prazos; mapear e intervir nos problemas, com ações socioculturais de alto nível; aproveitar ao máximo o evento antes, durante e depois.

É um direito e um dever ir além do campo esportivo, agregar valores e realizações que fiquem.Temos um histórico de vitórias esportivas. É hora de outras conquistas. Os Jogos são uma chance rara de ajudar a construir e a cumprir esse plano estratégico. Os ganhos nos níveis do emprego direto e indireto na cultura, na segurança, na educação e em outros domínios são conhecidos. Mas também são conhecidas experiências com baixo resultado.

O Rio é, historicamente, uma cidade esportiva e tem tudo para servir de bom exemplo. Depende de nós: governos (sobretudo), empresários, universidades, escolas, comunidades. O Brasil precisa ganhar uma alma nova e passar suas instituições a limpo. Que tal aproveitarmos os investimentos e a pressão internacional que virão com os Jogos para fazer da segurança, do meio ambiente, da geração de empregos e da escola verdadeiras prioridades? Não é porque nos falta isso -os críticos têm lá as suas razões- que devemos ser contra a Olimpíada no Rio. Que tal fazermos desse megaevento um meio para melhorarmos em diversos aspectos?

Novos conceitos de cidadania, desenvolvimento e valorização do esporte educacional, envolvimento das escolas e do professorado e uma política de longo prazo para as áreas esportivas são legados exigidos pelo COI. Não são favores, são direitos previstos e bem vistos pelo comitê e por seus patrocinadores. Temos que fazer mais, organizar melhor e controlar os custos. Bilhões estarão em jogo e sob avaliação internacional. Nossa imagem também.

Esporte é uma atividade socioeducativa, uma expressão de identidade, um fator de socialização. Os esportes contribuem para aproximar da sociedade aqueles que a economia e a política afastam. Nenhum evento esportivo resolverá nossas questões básicas, estruturais e históricas, mas poderá ajudar. E como!

Mauricio Murad