Os investimentos do governo no álcool transformaram o Brasil em um dos líderes de produção de energia limpa, mas os esforços não são suficientes diante do tamanho da crise no setor. A opinião é de Yehiam Prior, diretor do departamento de química do Instituto Weizmann, em Israel, que pesquisa fontes alternativas de energia.

“A produção de álcool no Brasil deve ser melhorada por tecnologia e descobertas mais avançadas, que ainda não estão disponíveis ao meio científico. E, mesmo que a tecnologia seja exportada e melhorada, seria uma contribuição, mas não seria suficiente para resolver o problema energético do mundo”, avalia Prior.

Para Prior, que vem ao Brasil participar de debate sobre a crise energética mundial no próximo domingo (28) em São Paulo, o álcool é uma solução a curto prazo, que não contenta o aumento vertiginoso da demanda energética em países como Índia e China. “Teríamos que plantar o planeta inteiro para fabricação de biocombustível para saciar a demanda crescente.”

Não apenas o álcool brasileiro, como toda forma de biocombustível, energia eólica, hidrelétrica e mesmo nuclear –defendida por alguns países como a grande solução energética do século 21– são medidas de curto prazo, diante da extensão da crise energética.

O caminho para as próximas décadas, sugere Prior, está justamente em não apostar em uma única saída e amenizar os contrapontos de cada fonte de energia renovável. Já a longo prazo, o químico israelense é enfático na solução: energia solar.

“Se você fizer um balanço global, a quantidade de energia solar que recebemos é imensa e mal aproveitada. A tecnologia disponível ainda é insuficiente para uso em grande escala. Sem investimento em pesquisa, não vejo solução viável”, afirma o professor.

Ciência e a crise

O professor é cético quanto a um possível aumento da verba destinada à área em um contexto global de intensa dependência do petróleo, mas aposta em mudanças com o “despertar de uma nova consciência”.

“Não há esforço governamental na área, porque os políticos têm dificuldade de pensar 20 ou 30 anos a frente por resultados. O que vemos é que os governos e agências de financiamento estão investindo em pesquisas a curto prazo e o mercado privado deve seguir a tendência, em tempos de restrição financeira”, explica Prior.

Os anos de dependência extrema do petróleo impediram ainda, argumenta o professor, o desenvolvimento de uma classe de cientistas especializados na área de alternativas energéticas –dificuldade que levou o Instituto Weizmann a “emprestar” cientistas de outras áreas similares em troca de financiamento de longo prazo.
Nuclear

Alguns governos apostam na controversa energia nuclear “de fins pacíficos”, como a Venezuela e o Irã. Mas Prior alerta que construir usinas nucleares por todo o planeta não trará a solução esperada.

“Primeiro, há um problema com o destino de lixo nuclear. Nós, cientistas, simplesmente não sabemos o que fazer com ele, então guardamos e esperamos”, afirma Prior. Em pequena escala, o lixo nuclear pode ser armazenado com relativa tranquilidade e controle, mas quando a tecnologia passa a ser usada por países sem recursos financeiros suficientes ou atenção às regras ambientais, o risco não compensa as vantagens do recurso.

“Ter muitas usinas nucleares espalhadas pelo mundo faz com que percamos o controle desta produção e o problema deixa de ser energético para se tornar político. Não há problema em Brasil, França ou Alemanha terem usinas, mas me preocupa quando Irã e Paquistão mostram ambições nucleares”, avalia o professor.

Para o professor, aumentar a consciência sobre a crise energética global é a questão central. “Precisamos separar realidade de mitos. Não devemos assustar as pessoas de que o nível da água vai subir dois metros nos próximos anos. Este é um longo processo, não sabemos quanto vai subir no fim do século. O problema já é sério o suficiente sem exageros.”

Fonte: Márcia Soman Moraes da Folha Online