Nos bons tempos, o filho de Miguel Salcedo, um imigrante ilegal em San Diego (EUA), mandava para casa centenas de dólares por mês para ajudar sua família em dificuldades no México. Mas, com a economia americana em frangalhos e seu filho desempregado, Salcedo se vê fazendo o que nunca pensou que seria necessário: enviar dinheiro para o norte.

O desemprego atingiu as comunidades de imigrantes nos EUA com tal força que um novo e surpreendente fenômeno foi detectado: em vez de receber remessas de parentes que trabalham no país mais rico do mundo, algumas famílias pobres mexicanas estão juntando o que podem para ajudar seus parentes desempregados nos EUA. “Mandamos sempre que temos um pouco a mais, pelo menos para que ele possa comer”, disse Salcedo, que é de uma pequena aldeia no Estado rural de Oaxaca e faz “bicos” para sustentar sua mulher, seus dois filhos menores e agora o filho mais velho, desempregado na Califórnia.

Ele não é o único. Leonardo Herrera, agricultor no sul do México, disse que recentemente vendeu uma vaca para ajudar a levantar US$ 1.000 e enviar para seu sobrinho na Califórnia. Ali perto, María del Carmen Montufar juntou dinheiro com seu marido e outros parentes para mandar a sua filha Candelaria, na Carolina do Norte. No ano passado, a família enviou dinheiro -pequenas quantias que vão de US$ 40 a 80- oito vezes para ajudar Candelaria e seu marido, ambos desempregados e com um bebê.

“Quando ela está trabalhando, nos manda dinheiro”, disse a mãe. “Mas, agora, como não tem trabalho, nós que lhe enviamos.” É difícil obter estatísticas sobre a extensão do que os especialistas chamam de “remessas invertidas”. Mas entrevistas com autoridades, operadoras de transferência de dinheiro, especialistas em imigração e parentes de imigrantes desempregados mostram que transações antes raras parecem estar aumentando.

“É surpreendente, um sintoma da crise econômica”, disse Martín Zuvire Lucas, que dirige uma rede de bancos comunitários que operam em comunidades pobres de Oaxaca e outros Estados mexicanos. “Não conseguimos medir isso, mas ouvimos falar de mais casos em que o dinheiro está indo para o norte.”

Em um pequeno banco do Estado de Chiapas (sul do México), hoje há mais dinheiro vindo dos EUA do que indo para lá. “Todo mês, 50 mil pesos (R$ 6.620) são enviados daqui [México] para lá”, disse Edith Ramírez Gonzalez, executiva de vendas do Banco Azteca em San Cristóbal de las Casas. “E de lá recebemos cerca de 30 mil pesos”.

Com cerca da metade de sua população vivendo na pobreza, o México não está bem posicionado para ajudar seus cidadãos em dificuldades no exterior. O país poderá perder até 735 mil empregos neste ano, e sua economia poderá cair 7,5%, segundo economistas.

Mas a pobreza é um conceito relativo. É mais fácil viver com pouco no México, especialmente nas áreas rurais, o que permite que os pobres ajudem os que estão em situação ainda mais difícil. Em Miahuatlán, Sirenia Avendano e seu marido podem estar em piores condições que seus dois filhos, ambos na faixa dos 20 anos, que trabalham como garçons em um restaurante mexicano na Flórida. Mas eles tiveram suas horas de trabalho reduzidas, e as gorjetas secaram. Já os pais vivem em uma casa própria, onde plantam milho e outros alimentos.

“Somos pobres, mas ninguém pode nos tirar desta casa”, disse a mãe, enxugando as lágrimas. Para ajudar os filhos, ela vende pimentões recheados, um prato popular mexicano, na vizinhança. Em outros casos, os migrantes estão voltando para casa, como os muitos passageiros que saltam do ônibus que liga regularmente o norte da Califórnia a um posto de gasolina em Miahuatlán. “Não há nada lá em cima”, disse um rapaz com uma mala estufada que voltou em uma noite recente. A senhora Salcedo, que no último ano mandou para seu filho de 18 anos cerca de US$ 60 cinco vezes, disse: “Nós decidimos apertar o cinto até que todos tenham trabalho novamente”.

The New York Times