Há dois anos, uma comissão científica internacional chamou a atenção mundial ao relatar que a atividade humana estava aquecendo o planeta de maneiras que poderiam perturbar gravemente a natureza e a vida.
O trabalho do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) dividiu o Prêmio Nobel da Paz de 2007 com o ex-vice-presidente dos EUA, Al Gore. Após duas décadas apresentando sem alarde relatórios climáticos ao mundo, de repente o comitê ganhou ampla audiência.

No entanto, enquanto o painel prepara a sua próxima revisão climática, muitos especialistas em ciência e políticas climáticas, dentro e fora do comitê, alertam que ele pode rapidamente perder sua relevância se não ajustar seus métodos e seu foco.

A comissão, que foi criada em 1988 e opera sob os auspícios da ONU, recebe prêmios e aclamação, mas há poucas evidências de que as nações estejam agindo a partir de seus alertas. As emissões de gases do efeito estufa cresceram. As discussões sobre um novo tratado climático continuam em grande medida emperradas.

Ambientalistas afirmam que os relatórios da comissão são atenuados pela exigência de que os governos patrocinadores aprovem seus sumários linha por linha. Alguns especialistas dizem que a organização, encarregada de avaliar uma ciência que evolui rapidamente, não consegue se manter a par de um aumento explosivo da pesquisa climática.
Ao mesmo tempo, cientistas que questionam a probabilidade de uma perturbação calamitosa do clima acusam o painel de escolher estudos que apoiam suas opiniões e de minimizar os níveis de incerteza em torno da gravidade do aquecimento.
“Dá a impressão de que IPCC deixou de ser um mediador da ciência para virar um porteiro”, disse John Christy, climatologista da Universidade do Alabama em Huntsville e ex-integrante do painel.

Em entrevista, Rajendra Pachauri, presidente do IPCC, rejeitou a acusação de parcialidade, citando o mecanismo da revisão entre pares. Mas reconheceu os desafios que o grupo enfrenta na tradução de complexos estudos científicos para uma forma que resulte em respostas significativas. Por seu estatuto, o grupo não pode recomendar um rumo de ação para a redução dos riscos climáticos. Ele apresenta caminhos específicos que os governos podem ou não seguir no que diz respeito a emissões de gases do efeito estufa.

Encontrar meios de orientar as nações sem prescrever políticas é um foco primordial naquela que será a sua quinta avaliação sobre as pesquisas climáticas. Embora o novo estudo só deva ser divulgado em 2014, seu formato será determinado em outubro, numa reunião de 80 países em Bali.

Preparando esse encontro, 200 cientistas se reuniram em Veneza no mês passado para identificar novas prioridades. Baseando-se em um “documento de visão” desenvolvido por Pachauri, eles começaram a escrever um esboço do quinto relatório. Uma das metas é obter uma avaliação muito mais minuciosa de até onde e com que velocidade os mares devem subir se o aquecimento não for contido. O relatório de 2007 do comitê excluía expressamente a influência do degelo polar por causa da limitada compreensão a respeito.

Evitar a discussão de tais possibilidades por falta de confiança científica pode dar a entender que haja pouca probabilidade de que isso venha a ocorer, disse Stephen Schneider, climatologista da Universidade Stanford, na Califórnia, e veterano integrante do comitê. E não é esse necessariamente o caso, acrescentou.

Afinal, talvez, a mudança mais necessária para a comissão seja prestar mais atenção às possibilidades mais sombrias, mas também mais cheias de consequências, de um mundo em aquecimento, disse Schneider. Pode ser desconfortável para os cientistas, que buscam certezas nos dados, se voltar para a questão de como pesar ameaças incertas. Mas os tomadores de decisões não estarão bem servidos se o espectro de possibilidades mal conhecidas, com o respectivo nível de incerteza, também não for informado pelos cientistas, argumentou ele. “Se você não disser nada até que tenha uma elevada confiança e uma sólida evidência, você está traindo a sociedade.”

ANDREW C. REVKIN
New York Times