O governo francês pretende usar a segunda visita oficial do presidente Nicolas Sarkozy ao Brasil, entre hoje e amanhã, para ampliar o “viés civil” da Parceria Estratégica entre os dois países. Depois de firmar a venda de submarinos e helicópteros em um acordo de ? 8,6 bilhões (R$ 22,6 bi) e conquistar o favoritismo na licitação FX-2, do Ministério da Defesa, o Palácio do Eliseu quer agora aprofundar os negócios em áreas como energia nuclear, transportes e a exploração do espaço. Para os franceses, o Brasil é ainda visto como plataforma na qual suas empresas poderão produzir e vender para toda a América Latina.
O foco da Parceria Estratégica foi revelado pelo conselheiro diplomático do Palácio do Eliseu, Jean-David Lévite, na sexta-feira, em Paris. A ambição do governo francês é reduzir o peso militar das relações comerciais entre os dois países, ampliando os negócios civis. “Os contratos militares progrediram rapidamente, mas os civis vão ultrapassá-los em breve”, estimou Lévite.
Só para a compra dos quatro submarinos convencionais Scorpène, para a produção do casco de um submarino nuclear e a construção de uma base naval e de um estaleiro no Rio, o Ministério da Defesa vai desembolsar 6,7 bilhões, de acordo com os números divulgados em Paris. Outros 1,9 bilhão vão para a aquisição de 51 helicópteros pesados Cougar EC-725, que serão produzidos no Brasil pela Helibras, subsidiária da francesa Eurocopter.
O governo francês confia ainda no favoritismo dos aviões de caça Rafale, produzidos pela Dassault, que competem com os americanos F/A-18 da Boeing e com os suecos Gripen NG na licitação FX-2, que prevê a compra de 36 aviões para a Força Aérea Brasileira (FAB). O resultado da seleção pode até ser divulgado amanhã.
A França também planeja usar o Brasil para transformar o país em um trampolim comercial no continente. “O Brasil será uma plataforma de reexportação para toda a América Latina de produtos franceses fabricados no país, como os helicópteros Eurocopter, os submarinos DCNS e os aviões, se for o caso”, afirmou o conselheiro de Américas da Presidência francesa, Damien Loras.
COMÉRCIO
O sucesso nos negócios militares, que seria motivado pela disposição de transferir tecnologia de forma irrestrita, faz o Palácio do Eliseu se mostrar otimista quanto à abertura de novas frentes comerciais, agora civis. Uma comitiva de seis ministros de Estado – Christine Lagarde, da Economia, Bernard Kouchner, das Relações Exteriores, Hervé Morin, da Defesa, Eric Besson, da Imigração, Frédéric Mitterand, da Cultura, e Dominique Bussereau, dos Transportes – acompanhará Sarkozy, apesar de a visita ter duração de menos de 24 horas.
Além dos líderes políticos, 26 grandes empresários, representantes de empresas como Rodia, DCNS, Dassault, Safram, Alstom, EDF, Areva e Sanofi-Aventis, estarão na delegação, estreitando relações e apresentando projetos ao Brasil.
O governo francês planeja, por exemplo, aprofundar negociações sobre a possível compra de lançadores de foguetes Astrium. Em julho, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, visitou as instalações da companhia em Toulouse, no sul do país, onde são produzidos satélites e veículos lançadores.
Entre os focos de interesse civil, estão a venda de reatores para as quatro novas usinas nucleares planejadas pelo Ministério de Minas e Energia até 2030, mercado estimado em torno de R$ 40 bilhões. A França vai oferecer o Reator Pressurizado Europeu (EPR), cuja produção de lixo radioativo é reduzida.
Outro ponto de atenção é a licitação para a construção do trem de alta velocidade entre Rio, São Paulo e Campinas. A Alstom – empresa que enfrenta suspeitas de pagamento de propina para a venda ao metrô de São Paulo – vai intensificar o lobby, valendo-se do apoio do governo francês e, mais uma vez, de propostas de transferência de tecnologia.
Andrei Netto
Estado de São Paulo