O Brasil pode cortar 35% de suas emissões de gases-estufa em relação à trajetória atual até 2020. É o que indica um estudo preliminar, que será apresentado hoje em Brasília ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao qual a Folha teve acesso.
O cálculo foi feito a pedido do Ministério da Ciência e Tecnologia pela Rede Clima, um grupo ligado à pasta que reúne pesquisadores do país inteiro.
Ele embasa em parte a proposta do ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) de cortar até 40% das emissões do país em relação ao cenário tendencial.
Lula deve definir hoje a meta de desvio da trajetória de emissões que o Brasil apresentará na conferência do clima de Copenhague, em dezembro.
Há duas opções na mesa. Uma prevê só a redução de 80% no desmate na Amazônia até 2020; isso daria um total de desvio de cerca de 26%, segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Minc tem apostado num número mais alto, de 30% a 40%, que preveja reduções em vários setores da economia. Mas enfrenta resistências do Itamaraty e da Ciência e Tecnologia – pasta que discordou do cálculo feito por Minc e pediu a nova estimativa à Rede Clima.
Embora não endosse a proposta de Minc, o estudo mostra como cortar emissões de carbono em seis setores da economia: energia, biocombustíveis, agricultura, reflorestamento, desmatamento no cerrado e desmatamento na Amazônia. No total, seria possível abater de 887 milhões a 1,041 bilhão de toneladas de CO2 até 2020.
Para o setor de agricultura, ele dá inclusive uma estimativa do custo da redução: R$ 40 bilhões em dez anos, a serem empregados em recuperação de 11 milhões de hectares em pastagens, entre outras ações.
“É uma estimativa preliminar, que mostra que o Brasil tem potencial de redução em vários setores”, disse o climatologista Carlos Nobre, do Inpe, coordenador da Rede Clima.
Só com a expansão dos biocombustíveis, avalia o estudo, há potencial de evitar a emissão de até 50 milhões de toneladas de CO2 por ano.
Reduzindo o desmatamento no cerrado, o país poderia poupar outros 121 milhões de toneladas de gás carbônico por ano, indicam projeções de Mercedes Bustamante (Universidade de Brasília) e Laerte Ferreira (Universidade Federal de Goiás). Isso considerando uma redução de 80% na taxa de desmatamento nos 18% da área total do bioma (ou 360 mil quilômetros quadrados, o equivalente a uma Alemanha) que ainda estão disponíveis para a expansão da agropecuária.
Pressão
Em Barcelona, onde começou ontem a última reunião diplomática preparatória para Copenhague, as ONGs pressionaram o governo brasileiro por conta da reunião de hoje, que deve definir a meta.
“É uma oportunidade para o presidente Lula entrar para a história como herói ou vilão”, afirmou Gaines Campbell, da Vitae Civilis. “Se o Brasil recuar, outros farão o mesmo.”
Paulo Adário, do Greenpeace, fez referência às propostas em discussão no Congresso e no governo para enfraquecer o Código Florestal, anistiando o desmatamento -ao mesmo tempo em que o país se prepara para assumir um compromisso internacional de reduzi-lo.
“Lula precisa mostrar não só liderança externa como também interna”, afirmou.
Cláudio Angel
Folha de S. Paulo